quinta-feira, 4 de outubro de 2012

França busca seu espaço no segmento de carros de luxo



Por Sam Schechner e David Pearson
The Wall Street Journal, de Paris

Em um reluzente palco negro do Salão Automóvel de Paris, a montadora novata Exagon Motors mostrou esta semana sua nova criação: o EGT Furtive, o automóvel mais luxuoso da França.

Executivos da Exagon se gabam que seu híbrido de € 400 mil (US$ 516 mil) vem com interior em couro personalizável, carroceria e estrutura em fibra de carbono rígido, e dois potentes motores elétricos. Mas embora rico em alta tecnologia, o carro da Exagon carece de um elemento que tradicionalmente envolve os bens de luxo: a tradição.

Apesar da longa lista de marcas francesas de luxo, desde o champanhe Veuve Cliquot até a grife Chanel de alta costura e os jatos executivos Falcon, o país luta há mais de meio século para entrar no mercado dos carros de luxo, agora dominado por um quarteto de marcas alemãs: a BMW, a Mercedes-Benz, da Daimler, e o Audi e o Porsche, da Volkswagen.

"Na França, que afinal é o país dos artigos de luxo, há um grande buraco no setor automotivo", diz o diretor-presidente da Exagon, Luc Marchetti, dono da equipe de carros de corrida Exagon Engineering SA. A empresa sediada em Magny-Cours, na França, tem encomendas para 60 veículos e espera começar as entregas no início do ano que vem.

Marchetti não está sozinho. As marcas francesas Renault e PSA Peugeot Citroën estão ansiosas para terminar com sua ausência prolongada do segmento de luxo, que as deixou vulneráveis ao desaquecimento econômico da região. Seus veículos da faixa média estão sob ataque em duas frentes: por parte das marcas de luxo, como a Mercedes, que estão passando para um setor de preço mais baixo, e dos novos rivais asiáticos, que crescem agressivamente na Europa.

O resultado é uma pressão sobre os lucros que está atingindo com mais força os fornecedores do mercado de massa. No primeiro semestre de 2012, por exemplo, a Porsche teve uma margem de lucro operacional de 18,7%. Em contraste, a divisão automotiva da Renault quase não deu lucro e a divisão automotiva da Peugeot Citroën ficou enterrada no vermelho.

As montadoras francesas estão partindo para um ataque de luxo. Como parte da sua nova entrada no setor mais sofisticado, a Peugeot está renovando suas concessionárias, dando ao comprador uma experiência mais exclusiva. Já a Renault está buscando em seu portfólio para ver quais marcas antigas poderiam atrair os compradores de carros de luxo. E ambas as empresas, em alguns casos, fizeram consultas com designers das principais grifes da alta moda.

Os resultados estão sendo exibidos esta semana no Salão do Automóvel de Paris. A Peugeot está mostrando uma nova versão conversível do seu bem sucedido subcompacto DS3, parte da nova série DS de carros de prestígio, que ela espera que levante a marca Citroën para uma faixa superior do mercado. A empresa vendeu 250 mil carros DS desde o lançamento em 2010 - uma das poucas histórias de sucesso de uma montadora que teve prejuízo líquido de € 819 milhões no primeiro semestre.

A Renault, por sua vez, está perto de decidir se dará ou não uma nova vida, juntamente com uma empresa parceira, à sua marca Alpine de carros esporte, e montou uma equipe interna para trabalhar em um projeto de carro de luxo. "Meu desafio é conseguir credibilidade no setor de luxo", diz o diretor operacional da Renault, Carlos Tavares.

No passado, as montadoras francesas já tiveram uma forte presença no segmento luxo. Nas décadas de 1920 e 1930, marcas de primeira linha como Delage e Delahaye eram populares. Mas após a Segunda Guerra Mundial, o governo francês nacionalizou várias empresas, como a Renault, e lhes deu outro direcionamento, pedindo-lhes que reconstruíssem a base industrial do país. Com falta de matérias-primas, as marcas de luxo foram vendidas a rivais maiores, ou acabaram desaparecendo.

Durante anos, a cultura automobilística na França permaneceu mais igualitária e moderada, produzindo apenas raros ícones de luxo, como o DS da Citroën, lançado em 1955. Nos anos 1970 e 1980, o mercado de luxo para todos os tipos de bens adotou novos valores. Foi-se embora a discrição, e chegou a moda da ostentação - e as montadoras francesas ficaram para trás.

"O luxo mudou brutalmente, ficou muito mais exibicionista, mais dinheiro novo", diz Eric Fouquier, cuja consultoria Thema estuda os hábitos de consumo para marcas e montadoras de luxo. "Para os fabricantes de automóveis franceses, isso não estava no seu DNA cultural."

O governo francês não tem ajudado. As montadoras culpam os impostos, como os que incidem sobre as emissões de carbono, pela queda na demanda. Se as vendas de carros de luxo na França totalizam apenas um quinto das registradas na Alemanha, "isso se deve, principalmente, ao acúmulo de diversos impostos", diz Patrick Blain, diretor da associação das montadoras francesas.

Agora as montadoras francesas esperam que o luxo se torne seu passaporte para ingressar na China, um mercado em rápido crescimento, com predileção pelas marcas europeias.

"Mesmo antes de termos sucesso na Europa, creio que teremos sucesso na China, e depois na América Latina", diz Tavares, da Renault. "E se tivermos sucesso nesses mercados, então isso vai se refletir de volta na Europa."