sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Salão de Paris abre em tom melancólico


Valor 28/09
Em tempos de crise no mercado doméstico, a indústria automotiva europeia abriu, ontem, melancolicamente o Salão do Automóvel de Paris à imprensa internacional. Depois de onze meses seguidos de queda nas vendas de carros e alta ociosidade nas fábricas, o enxugamento do parque de produção parece ser um caminho inevitável para alguns dos dirigentes das principais montadoras na região.

O risco do fechamento de mais fábricas foi citado no evento de ontem pelos presidentes globais da Renault - Nissan, Carlos Ghosn, e da Fiat, Sergio Marchionne.

Mas antes disso, em premiere da Volkswagen na noite de quarta-feira, o presidente do conselho de administração da montadora alemã, Martin Winterkorn, já reconhecia que o salão francês começaria em um momento de turbulência, cuja extensão é totalmente imprevisível.

O brasileiro Ghosn, que vem atribuindo o cenário negativo à situação de competitividade no continente, considerou que a crise será de longo prazo e 2013, provavelmente, será ainda pior do que 2012, quando o mercado europeu recua 7,1%.
"Infelizmente, não vemos uma situação melhor até o fim do ano", comentou o executivo a jornalistas ontem, acrescentando que, na melhor das hipóteses, o mercado vai se estabilizar nos baixos volumes atuais durante o ano que vem.

Já Marchionne foi menos contundente nas declarações, mas disse ver crescer a possibilidade de fechamento de fábricas após cinco anos de retração nas vendas de carros na Europa.

Desde setembro do ano passado, os emplacamentos de carros na União Europeia não conseguem mostrar crescimento comparativamente a igual período do ano anterior. Nos mercados da França e da Espanha, por exemplo, as vendas recuam 13,4% e 8,5%, respectivamente, enquanto que na Alemanha, maior mercado europeu, houve declínio de 0,6% de janeiro a agosto.

Estimativas não oficiais indicam uma ociosidade de quatro a cinco milhões de carros nas fábricas da Europa. "O clima é pesado, o contexto é duro e não é simples", resume o executivo português Carlos Gomes, presidente da PSA Peugeot Citroën no Brasil e na América Latina.

"Na Europa, a indústria terá que se articular em termos de capacidade. Há que redimensionar o aparelho produtivo europeu", diz o executivo. Entre os maiores atingidos pela derrocada no mercado automotivo europeu, a PSA decidiu fechar sua fábrica em Aulnay-sous-Bois, nos arredores de Paris.

Segundo Ghosn, a indústria é capaz de administrar excessos de capacidade por um prazo longo, de até dois anos. Mas o problema, disse ele, é quando essa situação acontece sem que exista uma visão clara sobre como enfrentá-la, o que leva fabricantes a considerar cortes de capacidade produtiva.

"Não quero dizer que a Europa não encontrará uma saída, mas a dúvida é sobre quanto tempo isso vai levar", afirmou Ghosn, que prevê um longo percurso para a recuperação do mercado europeu.
Enquanto a Europa, assim como o Japão, é um dos focos de atenção do grupo, o presidente da Renault-Nissan afirmou não ter preocupação com a desaceleração da economia chinesa, onde está o maior mercado de carros do mundo. Não estou preocupado com a China", comentou o executivo, justificando a avaliação pelos investimentos em infraestrutura e o baixo déficit orçamentário do país asiático.

Ghosn evitou cobrar estímulos públicos e lembrou que, no fim das contas, caberá a cada montadora superar essa crise na Europa.

Por parte da Renault-Nissan, seu presidente afirmou que as marcas manterão o foco na busca por mais sinergias, com maior coordenação em processos de manufatura e compras conjuntas. "Podemos fazer mais", disse Ghosn, após avaliar que as duas marcas já teriam desaparecido não fosse a aliança feita em 1999, levando-se em conta as crises enfrentadas desde então.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Salão de Paris é oportunidade para francesas voltarem a brilhar no setor



Por John Reed
Financial Times, de Londres

A PSA Peugeot Citroën e a Renault, duas das fabricantes nacionais da automóveis da França, pretendem deslumbrar o mundo automobilístico em seu território nesta semana, no Salão do Automóvel de Paris, com um desfile de novos modelos.

Na exposição, que começa amanhã, a Peugeot estará apresentando nada menos que 40 carros em seu estande de 3.900 metros quadrados, incluindo o Onyx, um super-carro conceitual esportivo que parece uma casa perto de um Lamborghini.

A Renault vai anunciar a quarta geração de seu Clio hatchback, o primeiro carro de produção em massa projetado por Laurens van den Acker, o diretor de projetos contratado há três anos para apimentar uma linha de modelos que vinha sendo criticada como muito insípida.

Mas as novas rodas reluzentes das montadoras francesas escondem uma crise em que os mercados estão encolhendo e há muitas fábricas fazendo carros muito parecidos. Trabalhadores da fábrica da Peugeot em Aulnay-sous-Bois, nos arredores de Paris, que a montadora está fechando numa tentativa de estancar uma perda de caixa que chega a € 200 milhões por mês, marcaram uma manifestação no Salão do Automóvel para 9 de outubro.

O enorme excesso de capacidade da indústria automobilística europeia e as devastadoras guerras de preços serão motivos de discussão em uma reunião que haverá no salão entre altos executivos como Philippe Varin, da Peugeot, Carlos Ghosn, da Renault/Nissan e Sergio Marchionne, da Fiat.

A Peugeot e a Renault estão, juntamente com a Fiat, Ford e a divisão Opel da General Motors, entre as montadoras mais vulneráveis na atual desaceleração econômica. O mercado automobilístico da França já encolheu 13% este ano e as companhias francesas também sofreram reduções significativas das vendas na Itália e na Espanha, países que passam por recessão.

A Renault, que tem mais negócios fora da França e fábricas de baixos custos na Romênia e no Marrocos, é entre as duas a que está com menos problemas financeiros, conforme Ghosn, certamente, vai enfatizar nas entrevistas que concederá no Salão de Paris.

Entretanto, as duas companhias são especializadas em carros pequenos e de baixas margens, os mais vulneráveis à guerra de preços que está levando a maior parte das montadoras do continente a ter perdas financeiras este ano. A PSA Peugeot perdeu € 819 milhões antes dos impostos no primeiro semestre; a Renault, ajudada pelas subsidiárias, que incluem a Nissan, registrou um lucro líquido bem menor de € 786 milhões e terminou o primeiro semestre com o caixa negativo em € 200 milhões.

As duas companhias estão sendo espremidas por cima pelos fabricantes alemães de carros de luxo e pela Volkswagen, e por baixo pelas fabricantes sul-coreanas em ascensão: Hyundai e Kia. A Volks e os coreanos vêm tomando participação de mercado dos franceses no mercado doméstico, o que já levou Arnaud Montebourg, o ministro da Indústria da França, a acusar a Hyundai e a Kia de "dumping", o que as companhias negam.

"Isso é crítico para a Peugeot e a Renault", diz Emmanuel Bulle, analista da Fitch Ratings. "Elas estão espremidas e serão trituradas de um lado pelos alemães, que estão entrando em categorias inferiores, e pelos coreanos, que estão seguindo o mesmo caminho que os japoneses há poucos anos, oferecendo produtos melhores."

Em Paris, a Volks vai anunciar a sétima geração do Golf, um grande sucesso perene de vendas na Europa. A Volks vai fabricá-lo em uma arquitetura compartilhada com o A3 da Audi e vários outros veículos, permitindo a ela alavancar uma vantagem de custo que está ajudando cada vez mais a montadora alemã a superar seus concorrentes.

Além do poder de marca mais forte da Volks e das maiores economias de escala, o grupo pode conseguir financiamentos mais baratos que seus concorrentes mais fracos, que ela pode repassar para os clientes na forma de financiamentos automotivos mais baratos. "Em termos do custo total de posse, faz muito mais sentido para um consumidor recorrer a um produto alemão - os custos de financiamento são menores e os valores residuais são maiores", afirma Erich Hauser, analista do Crédit Suisse.

As montadoras francesas têm duas escolhas: lutar com a Volks e os coreanos modelo a modelo, ou fazer uma retirada estratégica de mercados ou segmentos em que elas não podem fazer isso.

A Fiat, que diminuiu bem o número de lançamentos nesta crise, está adotando a primeira estratégia. A companhia, aparentemente calculando que faz pouco sentido lançar modelos em um mercado onde não consegue ganhar dinheiro, não estará exibindo nenhum modelo novo no salão.

No entanto, as duas montadoras francesas - especialmente a Peugeot - estão respondendo vigorosamente ao desafio da Volks e dos coreanos com novos modelos voltados para os mesmos compradores de automóveis da Europa e outros países. "A Peugeot tem mais produtos em lançamento que a maioria das outras montadoras", diz Jonathon Poskitt, diretor de previsão de vendas da LMC Automotive para a Europa.

A Peugeot vai oferecer o conceito 2008, um veículo crossover voltado para os consumidores urbanos de mercados emergentes, que a companhia diz que vai produzir na França, China e Brasil. Sua marca irmã Citroën vai apresentar uma versão cabriolet de seu modelo sofisticado DS3.

A Renault, visando a lucrativa faixa mais barata do mercado, vai exibir as versões da segunda geração de sua marca romena Dacia, o modelo fechado Logan e o hatchback Sandero. Ghosn já disse que consegue uma margem de lucro de mais de 6% com seus modelos de baixos custos.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Conteúdo local poderá ser atingido no Mercosul




As empresas que comercializam carros no Brasil terão de investir pelo menos 0,5% de seu faturamento em inovação, a partir de 2015, caso contrário terão de pagar os 30 pontos percentuais adicionais de imposto cobrados desde o início do ano de um grupo restrito de automóveis importados. Em 2013, serão exigidos investimentos de 0,15% do faturamento e, em 2014, 0,3%. Essa é uma das principais exigências do novo regime automotivo cuja regulamentação deve ser divulgada oficialmente hoje. As empresas terão, ainda, de reduzir em 12% até 2017 o consumo energético dos carros.

O governo decidiu também que, para efeito de redução do IPI devido, as empresas terão de usar um percentual mínimo de peças e partes produzidas no Mercosul, não apenas no Brasil, como se chegou a divulgar anteriormente. As empresas terão direito a crédito presumido de IPI (desconto no imposto pago) equivalente a uma proporção do que for gasto em partes e peças fabricadas regionalmente. Em 2013, essa proporção será de 130%; em 2014, 125%; em 2015, 115%, até chegar a 100% em 2017. Caminhões pesados e médios terão percentuais maiores, e caminhões leves, percentuais intermediários. Empresas com produção de caminhões pesados e leves usarão uma média ponderada.

A meta para "eficiência energética" foi um dos pontos que mais exigiram discussões entre governo e empresas privadas, nas negociações que antecederam a regulamentação do novo regime automotivo, conhecido como Inovar-Auto. O governo cogitou incluir metas para redução de emissões de CO2, medida abandonada após discussões com os fabricantes. Foi estabelecida e meta de aumento da eficiência energética, o "poder calorífico" dos motores, medido em megajoules por quilômetro rodado.

Os consumidores terão uma tabela de conversão, para verificar o cumprimento das metas, em quilômetros por litro.
O Inovar-Auto tem incentivos para investimento na melhoria dos produtos: quem reduzir o consumo energético em 15%, poderá abater um ponto adicional no IPI; quem chegar a uma redução de 18% abaterá até dois pontos. Investimentos de pelo menos 1% do faturamento para desenvolver engenharia no país darão direito a abater uma proporção desses gastos, até o limite de um ponto percentual do IPI. Também poderão abater do IPI, até um ponto percentual, o gasto a partir de 1,3% com pesquisa e desenvolvimento no país.

As montadoras, consultadas durante a definição do decreto com as regras do Inovar-Auto, informaram ao governo ser difícil encontrar vantagem econômica em investir em eficiência energética em troca de apenas um ponto de abatimento no IPI.

As exigências de investimento em inovação e em conteúdo local afetam diferentemente as empresas do setor - para evitar que o descontentamento gerasse ações contra o Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC), o governo brasileiro incluiu uma cota de importação de automóveis sem o IPI adicional, equivalente à importação média das empresas, nos últimos três anos, no limite máximo de 4,8 mil veículos por firma. Essa cota vale até 2017.

Para ingressar no regime automotivo, as empresas terão de optar por três entre quatro exigências da lei: 1) realizar no país atividades fabris ou de infraestrutura; 2) investir no país em pesquisa, desenvolvimento e inovação; 3) fazer no país gastos em engenharia, tecnologia industrial básica e capacitação de fornecedores; e 4) aderir ao programa de etiquetagem veicular nacional.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Regime ou dieta automotiva?


Valor 13/09

Sem menção explícita a controle de emissões de CO2, ao contrário do que chegou a cogitar o governo, o novo regime automotivo deve estabelecer uma meta obrigatória de redução de 11% no consumo de combustível dos automóveis medido em quilômetros por litro até 2017.
Os técnicos discutem agora o incentivo que será dado às empresas que anteciparem essa meta, o que lhes dará direito a abater até dois pontos percentuais no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) devido.

As montadoras que não se enquadrarem no novo regime automotivo terão de pagar os 30 pontos adicionais no IPI cobrados atualmente apenas de automóveis importados por empresas sem produção no país.

O governo, para evitar uma regra que mencionasse explicitamente a exigência de conteúdo nacional - e criasse risco de contestação na Organização Mundial do Comércio - inventou uma fórmula que estabelece um fator multiplicador a ser aplicado sobre o valor das compras de autopeças e partes. Mas, com isso, acabou criando reações do setor. Os executivos da indústria automobilística têm ido a Brasília sucessivamente para levar mais reivindicações ou mesmo contestar benefícios já concedidos. Isso tem gerado protestos dentro do próprio setor automotivo. "A gente até já percebe qual empresa enviou seus representantes aos ministérios no dia anterior quando o governo aparece com uma nova proposta", afirma um dos técnicos da indústria envolvido nas discussões.

Por conta dos medos que o governo tem de abir brechas ou precedentes a elaboração do regime automotivo vem se arrastando desde abril. A perspectiva de publicação do decreto vem sendo adiada há várias semanas.

Nem todos estão plenamente certos de que a proteção vai, de fato, ajudar o setor. O vice-presidente de compras da Volkswagen para a América do Sul, Alexander Seitz, diz estar preocupado com a falta de investimentos em automação nos fornecedores instalados no Brasil.

Segundo ele, esse será um dos maiores fatores de pressão de custos. "Com a perspectiva de ampliação da nacionalização, garantida pelo novo regime, o crescimento econômico em si, aumento de demanda no mercado de veículos e a previsão de mais crescimento com eventos importantes no país, como a Copa do Mundo e Olimpíada, esse seria o momento ideal para as empresas que fabricam componentes investirem nas compras de novas máquinas e de soluções tecnológicas. Seitz fala em nome de um empresa que no ano passado gastou perto de R$ 16 bilhões em compras no Mercosul.

Proposta para caminhões desagrada indústria e atrasa regime automotivo

A reação negativa da indústria à última proposta do governo para medir o conteúdo de peças nacionais em caminhões criou novo impasse na finalização do regime automotivo. Os representantes das montadoras decidiram reunir-se, hoje, em busca de uma contraproposta para reverter os índices apresentados pelo governo. Apesar da pendência, também hoje, técnicos dos ministérios da Fazenda, do Desenvolvimento e da Ciência e Tecnologia se reúnem para dar os últimos retoques no elenco de medidas. A equipe econômica espera que a publicação do decreto junto com a sanção da presidente Dilma Rousseff à MP 563 ocorra amanhã ou, no máximo, até segunda-feira.



A nova polêmica em torno, agora, dos caminhões, surgiu quando o governo decidiu fixar uma exigência inicial de conteúdo nacional para caminhões maior que a estabelecida para automóveis. A diferença é consequência da fórmula que foi criada para dar às empresas mais novatas tempo de adaptação às novas regras de nacionalização de autopeças.



O novo regime estabelece uma alíquota adicional de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de 30 pontos percentuais nos veículos que não atingirem 60% de conteúdo nacional. Mas, como várias empresas ainda dependem da importação foi criado um índice multiplicador, de 1,3 nas compras de componentes automotivos de cada empresa. O valor das compras de componentes, ampliado pelo multiplicador, pode ser descontado do IPI devido, o que permitirá às empresas abater até 100% dos 30 pontos percentuais adicionais do IPI. Esse multiplicador será gradativamente reduzido até 2017.



O multiplicador agradou os fabricantes de automóveis. Com esse adicional equivalente a 30%, as empresas ganharão uma proteção temporária enquanto aceleram os projetos de nacionalização doa carros. "Sem isso não poderíamos produzir no Brasil", diz o gerente geral de relações públicas e governamentais da Toyota, Ricardo Bastos. A Toyota acaba de inaugurar uma nova fábrica para produzir seu primeiro carro compacto no Brasil. É para esses novos investimentos que a proteção do regime automotivo está voltada.



Se para a montadora que ainda depende da importação o multiplicador representa um fôlego, para a que já tem índice de nacionalização elevado, a fórmula acaba por gerir um crédito que poderia, aos olhos da equipe econômica, estimular mais importação. É o caso do segmento de caminhões, que há anos opera com alto índice de conteúdo local, porque a nacionalização acima de 65% é condição para acesso ao Finame, linha do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) com taxas mais baixas para financiamento de caminhões, ônibus e máquinas.



Para evitar que a indústria usasse esse crédito para importar mais, o governo decidiu manter o multiplicador de 1,3 apenas para os automóveis, comerciais leves e caminhões pesados (com capacidade acima de 45 toneladas). A explicação, confirmada pelas empresas, é que os caminhões da linha pesada dependem mais de produtos importados, como itens para sistemas de transmissão.



Para os caminhões médios e leves, a equipe econômica estabeleceu o contrário. Criou um redutor, o que provocou os protestos da indústria. "Não é justo que para ajudar quem começa a investir agora no país sejam criadas regras que prejudiquem as empresas que há tempos se esforçam para nacionalizar seus produtos", afirma fonte da indústria



Já foi acertado que o multiplicador - ou redutor - será calculado por empresa, o que permitirá flexibilidade para complementar linhas. Ou seja, ao poder fazer o cálculo sobre o total das compras, a empresa poderá compensar a importação de componentes para produção de determinados veículos, principalmente os mais sofisticados, nos maiores volumes de compras de peças nacionais, utilizadas principalmente nos modelos mais simples. A indústria espera que a regra permita fazer a compensação para a importação de carros completos. O governo também está preocupado com empresas que produzem caminhões e automóveis.



A indústria de autopeças também aguarda mais informações sobre as regras. O presidente do Sindicato da Indústria de Autopeças (Sindipeças), Paulo Butori, diz estar preocupado com o aumento das importações. Segundo ele, este ano, a balança comercial do setor deverá apresentar um déficit de R$ 6,5 bilhões. No ano passado o resultado, também negativo, foi de R$ 4,5 bilhões.



"Se as montadoras vão ter proteção, as empresas que produzem as peças também precisam", destaca o dirigente. Segundo ele, a maior parte das compras externas é feita pelos fabricantes de veículos. Mas os fornecedores que fazem os conjuntos de componentes dos automóveis, como painéis, por exemplo, também importam componentes. É como ter esse tipo de controle, de toda a cadeia produtiva do setor, que hoje mais preocupa o governo.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Cota para importar carro do México chega ao limite



Por Sergio Leo - Valor 11/09
De Brasília

Pelo menos duas montadoras de automóveis no Brasil já esgotaram a cota de importações de carros do México ou têm, no máximo, o suficiente para trazer ao Brasil apenas um veículo, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento obtidos pelo Valor. Em março, para conter o crescimento das importações, a presidente Dilma Rousseff ordenou a renegociação do acordo automotivo entre Brasil e México, que permitia o livre comércio de automóveis entre os dois países e impôs cotas de importação. Neste ano, porém, as importações de carros continuaram subindo, e, de janeiro a agosto, já aumentaram, em quantidade, 108% acima do mesmo período do ano passado. Em valor, o aumento foi de 93%.

Na negociação com os mexicanos, foi fixado o limite de US$ 1,45 bilhão para as importações originadas do México de março de 2012 a março de 2013, e cada montadora recebeu uma cota individual. De janeiro a agosto deste ano, as importações de autoveículos (carros, ônibus, caminhões), já somaram US$ 2 bilhões. As empresas que superaram o valor das cotas só podem trazer carros ao país pagando tarifa de importação de 35% e adicional de dez pontos percentuais no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).

O total de importações de automóveis mexicanos trazidos ao país fora da cota, com pagamento de imposto adicional, já soma US$ 164 milhões. Esses carros só não chegarão mais caros ao consumidor, se a empresa decidir absorver, no preço, o custo do imposto cobrado a mais. Caso as montadoras decidam repassar o imposto aos preços no varejo, consumidores podem ser surpreendidos: algumas montadoras, alegando falta de carro em estoque, estão vendendo automóveis para entrega até em dezembro, com cláusulas nos contratos que obrigam os compradores a pagar mais do que preço atual, em caso de reajuste no valor dos carros.

As montadoras pressionam o governo para renegociar as cotas, o que está, até agora, fora dos planos da equipe econômica. O acordo renegociado em março já prevê um aumento progressivo do limite total de importação, que passará a US$ 1,56 bilhão em março de 2013 e US$ 1,64 bilhão em março de 2014. As montadoras também tiveram previsão de aumento progressivo no número de veículos que cada uma poderá trazer ao país.

Quando a presidente Dilma ordenou o cancelamento do acordo automotivo com o México, estava incomodada porque a importação de carros do país pelo Brasil havia aumentado 70%, em valor, em todo o ano de 2011.

O ministro de Relações Exteriores, Antônio Patriota, chegou a informar aos mexicanos que, como previa o acordo, o governo iria cancelar o livre comércio de automóveis com o México a partir de 2013. A pedido do presidente mexicano, Felipe Calderón, a presidente Dilma voltou atrás e aceitou renegociar os termos do acordo, que resultou nas cotas de importação.

Entre janeiro e agosto, entraram no Brasil 136,4 mil automóveis fabricados pelo México, mais que os 134,6 mil importados em todo o ano de 2011 e os 75 mil de 2010. Já foram registrados, em julho, casos de empresa que pediram licença de importação com as vantagens do acordo automotivo (sem imposto) acima do que permitia a cota e tiveram o pedido rejeitado.

Nos primeiros oito meses do ano, enquanto aumentavam as compras de carros do México, beneficiadas pelo acordo automotivo com o país, caíam as importações totais de automóveis. Desde janeiro, o governo brasileiro passou a cobrar um adicional de 30 pontos percentuais de IPI aos carros importados, isentando apenas montadoras com planos de investimento ou produção no país. A queda total nas importações de automóveis, de janeiro a agosto, em comparação com o mesmo período do ano passado, foi de 6,4% em valor e de 17% em volume.

Outros produtos, além de automóveis e veículos comerciais leves têm sido beneficiados pelo comércio automotivo com o México, que foi superávitário para o Brasil até 2010, quando os mexicanos passaram a ter superávit. A importação de autopeças originadas no México cresceu quase 33% de janeiro a agosto (em comparação aos primeiros oito meses de 2011); a de máquinas rodoviárias, quase 185%; e a de máquinas agrícolas, 266%.

Segundo apurou o Valor, nem todas as empresas que importam automóveis pagando adicional de imposto esgotaram a cota, porém, mas algumas decidiram, sem informar o motivo ao governo, trazer carros com a tributação, sem a isenção garantida pelo acordo automotivo. A redução do IPI no setor, neste ano, facilita a absorção do custo das importações de automóveis fora da cota.

Para um graduado integrante do governo, o pedido de renegociação das cotas feito pelas montadoras contraria a intenção oficial de estimular a produção de automóveis no país. A criação de um adicional no IPI dos automóveis importados, no fim de 2011, teve o objetivo de desestimular as importações e forçar as empresas a transferir a produção para o território brasileiro.

O principal alvo da barreira foram os carros chineses e, por força do acordo do Mercosul, o governo teve de isentar do aumento os carros com importação originada na Argentina e no Uruguai. Dilma irritou-se, porém, ao notar que o acordo com o México permitiu a montadoras - que reivindicaram a proteção contra os importados - trazer veículos do país, em escala crescente.


quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Após recorde de vendas, faltam carros nas concessionárias



Por Eduardo Laguna - Valor 06/09
De São Paulo

Dos estoques nas alturas - nos níveis mais críticos desde a crise financeira de 2008 - a listas de espera que facilmente ultrapassam 20 dias. Na esteira das marcas históricas nas vendas de carros, a realidade da indústria automobilística mudou radicalmente em apenas três meses.

Mas, se antes os volumes de veículos parados nos pátios de revendas e montadoras representavam um peso sobre os custos financeiros, agora a falta de carros nas lojas começa a travar o desempenho de algumas fabricantes - no momento em que o consumo chega ao ponto mais alto de todos os tempos.

Essa situação começou a ficar mais evidente em agosto, quando marcas como Ford, Nissan e Toyota não conseguiram acompanhar a corrida dos consumidores para aproveitar o que poderia ser o último mês de estímulos para as vendas de carros.

Apesar do recorde da indústria - com o mercado evoluindo a um ritmo de 15,4% -, as vendas da Ford tiveram crescimento abaixo da média, subindo apenas 4,8% na passagem de julho para agosto. Na mesma base de comparação, a Toyota ficou quase estável, com leve alta de 1%, enquanto a Nissan, na contramão, viu uma queda de 16,4% nos emplacamentos.
Basta ir às revendas para constatar que falta carro para atender tanta demanda. Em lojas da Ford, vendedores pedem um prazo de 20 a 30 dias para a entrega das versões básicas dos compactos Fiesta e Ka.

A Nissan, por sua vez, suspendeu as vendas de seu carro mais popular no país, o March. A rede de concessionárias da marca já não conta mais com o modelo em estoque e, em virtude da greve dos auditores fiscais da Receita Federal, um grande volume de carros está parado no porto.

As revendas não estão mais recebendo pedidos dos consumidores pela versão 1.0 do March. Para a versão do carro com motor 1.6, chegam a pedir quatro meses para a entrega. Os clientes também precisam ter paciência para comprar o Tiida, já que a fila de espera pode superar 40 dias. "Agosto foi o melhor mês da história, mas a Nissan não teve carro para vender", diz um vendedor da marca.

Lançado há um ano, o March rapidamente se tornou um dos cinco carros mais vendidos no segmento de hatch pequeno e catapultou a participação da Nissan no mercado brasileiro para 3,3%. Antes do carro, a montadora japonesa respondia por apenas 1,6% das vendas de automóveis e comerciais leves no país.

A marca também está esbarrando na cota de importações fixada na revisão do acordo automotivo com o México, de onde a Nissan traz mais de 70% dos carros que vende no Brasil - incluindo o March e o Tiida. As compras da montadora sem alíquota de importação de 35% estão limitadas a US$ 329 milhões por ano. Procurada pelo Valor, a Nissan não retornou aos pedidos de esclarecimentos.

Já a Toyota - ao comentar o desempenho no mês passado - disse que as vendas só não foram maiores por conta das férias coletivas de duas semanas na fábrica de Indaiatuba (SP), onde se produz o Corolla. Segundo a empresa, essas férias são regulares e acontecem anualmente para manutenção da linha de montagem.

A Ford, por sua vez, explicou que seu resultado foi influenciado pela transição de novos modelos, como o Novo EcoSport e a Nova Ranger. A montadora diz que o crescimento das novas linhas será gradual. Também ressalta que o impacto foi exacerbado pelo recorde da indústria. A participação de mercado da Ford caiu para 7,7% em agosto, abaixo de sua média no ano, de 9%.

"O movimento é pontual e considerado em nosso planejamento", afirma a montadora de origem americana, por meio de sua assessoria de imprensa.

Colocando na conta caminhões e ônibus, foram emplacados 420,1 mil veículos no país durante o mês passado, marca que surpreendeu muitos analistas e confirmou o recorde de vendas na história da indústria automobilística - superando as 381,6 mil unidades licenciadas em dezembro de 2010.

Fiat, Volkswagen, General Motors, Renault e Honda nunca venderam tantos carros no Brasil como no mês passado. A Fiat também teve recorde de produção na fábrica de Betim, em Minas Gerais, de onde saíram 82 mil carros.

Ao divulgar os números na terça-feira, Flávio Meneghetti, presidente da Fenabrave - a entidade que representa as concessionárias de veículos - reconheceu que diversos modelos não estão mais disponíveis para pronta entrega nas revendas. Segundo ele, os estoques de carros na rede de distribuição - tirando as montadoras - caíram para um volume equivalente a 15 dias de venda.

A capacidade de abastecimento da indústria pode ser um obstáculo para projeções que apontam para um crescimento de até 12% do mercado neste ano.

Mas Meneghetti diz que a tendência de desaceleração das vendas indica uma recomposição dos estoques ao longo de setembro - para um giro superior a 20 dias nas lojas. Para o executivo, os volumes diários devem voltar para cerca de 16 mil carros. Em agosto, por influência da antecipação de compras, a média diária somou 17,6 mil unidades.

Com a decisão do governo de prorrogar por mais dois meses os incentivos às montadoras, analistas acreditam que a demanda seguirá aquecida, mas poucos apostam na manutenção dos números registrados no mês passado.