segunda-feira, 20 de agosto de 2012

IPI salva montadoras


Valor 20/08


O socorro à indústria automobilística anunciado pelo governo no dia 21 de maio está salvando o ano de cinco das doze grandes montadoras instaladas no país. O apoio vindo de Brasília - que incluiu a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e medidas para destravar o crédito - inverteu a tendência negativa apresentada até maio por Fiat, Volkswagen e Ford, além das japonesas Honda e Toyota.

Seja pelo sucesso de novos modelos, seja pelo posicionamento em linhas estimuladas pela desoneração tributária, algumas marcas conseguiram aproveitar melhor do que outras o ciclo de incentivos do governo. Tirando da análise a dupla franco-japonesa Renault / Nissan - que já vinha em rápida expansão desde o início do ano -, Honda e Toyota foram as que mais cresceram após o corte nas alíquotas do IPI.

Além da maturação de lançamentos feitos no início do ano, o desempenho das marcas nipônicas reflete a recuperação dos resultados negativos de 2011, quando a produção foi comprometida pela falta de peças por fornecedores da Ásia, após o tsunami que atingiu o Japão em março do ano passado.

No grupo de elite, formado por Fiat, Volkswagen, General Motors (GM) e Ford - responsáveis por 70% dos carros vendidos no país -, todas conseguiram aumentar os volumes nos últimos dois meses - comparativamente a igual período do ano passado.

A GM, contudo, não acompanhou o ritmo dos concorrentes, perdeu mercado e segue em queda no acumulado do ano, assim como a dupla Peugeot / Citroën, que não consegue se levantar apesar dos estímulos governamentais (veja gráfico).

Envolta numa crise trabalhista em São José dos Campos - onde deixou de produzir recentemente os modelos Corsa, Meriva e Zafira -, a montadora americana conseguiu aumentar as vendas em 11,1% entre junho e julho, mas a participação de mercado acumulada no ano cedeu de 18% para 17,6% de maio - mês de anúncio dos incentivos - a julho.

Na soma dos sete primeiros meses de 2012, as vendas da GM ficaram 1,4% abaixo dos volumes de um ano antes, totalizando 349,7 mil carros de passeio e utilitários leves. Fiat e Volkswagen, na direção oposta, passaram a ter crescimento no ano: de 2,8% e 4,5%, respectivamente. Na Ford, quarta no ranking, a evolução nos sete meses foi mais tímida, de 1,1%.

Aliada a descontos praticados pelas marcas, a redução do IPI - de metade até a totalidade da alíquota, no caso dos carros populares - permitiu o acesso de novos consumidores ao mercado. "Aumentou muito a possibilidade de compra de um automóvel", diz Roberto Akiyama, gerente comercial da Honda.

Por outro lado, carros importados - de grifes voltadas a públicos abastados, como BMW e Porsche, a modelos mais populares de marcas chinesas como Chery e JAC Motors - seguiram em queda livre. Além dos 30 pontos adicionais de IPI - cobrados desde 16 de dezembro -, marcas sem fábrica no país tiveram competitividade abalada pela recuperação do dólar e amargaram um recuo de 41,4% nas vendas nos dois últimos meses.

Na Hyundai - que, pelas mãos do grupo Caoa, monta o Tucson e o utilitário HR em Anápolis (GO), mas importa a maior parte do que vende no Brasil -, houve queda de quase 20% no período.

Os efeitos foram intensos nos segmentos de maior giro do mercado automotivo: dos modelos compactos de entrada - os mais baratos, como Gol, Uno e Palio - aos sedãs médios, de preços mais altos, como o Corolla, da Toyota, o Civic, da Honda, e o Cruze, lançamento da GM.

Em julho, a Volkswagen comemorou seu melhor mês em 59 anos de história no Brasil, marcando emplacamentos de 78,3 mil carros. Na Toyota, as vendas do Corolla subiram 39,1% sem a cobrança do IPI cheio.

O movimento nas concessionárias segue forte em agosto, na esteira da corrida dos consumidores para aproveitar o que pode ser o último mês de IPI reduzido. Em suas manifestações públicas, o governo garante que os benefícios não serão estendidos. Mas a indústria quer desfrutar por mais tempo dos incentivos e seus dirigentes - incluindo a entidade representativa Anfavea -vêm alertando que sem eles o mercado não conseguirá sustentar o atual ritmo.

Na sexta-feira, a Fenabrave - entidade que abriga as concessionárias de veículos - defendeu a manutenção dos incentivos, além de medidas, como a liberação de compulsórios, para melhorar o crédito no mercado de motocicletas, que recua 8,5% no ano.

Balanço da entidade mostra que as vendas de automóveis e comerciais leves somaram 169,8 mil unidades na primeira metade de dias úteis de agosto, o que configura uma alta de 21,5% em relação ao mesmo período de 2011. Na comparação com a primeira quinzena de julho, as vendas mostraram leve queda de 0,45%. A Fiat liderou as vendas no período, com participação de 24%. Na sequência, aparecem Volkswagen (22%), GM (19,5%) e Ford (7,5%).

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Carro toma quase toda a rua sem transportar nem 1/3 dos paulistanos


FSP 16/08

Quanto espaço das ruas os 3,8 milhões de carros que circulam pela cidade tomam? Nos horários de pico, 78% das principais vias são dominadas pelos automóveis -dentro deles, são transportados apenas 28% dos paulistanos que optam pela locomoção sobre rodas. Enquanto isso, os ônibus de linha e fretados, com ocupação de 8% do asfalto, levam 68% das pessoas.

"Quem quer que seja o próximo prefeito, terá de olhar para esse dado, fazer uma política inteligente e tentar reduzir a desigualdade no uso das vias", diz Thiago Guimarães, especialista em mobilidade e professor da Universidade Técnica de Hamburgo, na Alemanha.

O levantamento foi feito pela reportagem com base em dados inéditos da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), obtidos com exclusividade. No quadro ao lado, é possível visualizar um retrato do trânsito na hora do rush. Trata-se da média da contagem de circulação ao longo de uma extensão total de 255 km. São as 32 rotas principais da cidade -algumas delas, com corredores de ônibus, caso das avenidas Rebouças e Santo Amaro. Depois, os veículos foram dispostos de acordo com o padrão adotado pelos engenheiros de trânsito (1 ônibus = 2 carros = 4 motos).

Segundo pesquisa do IBGE encomendada pela Rede Nossa São Paulo, no ano passado 82% dos paulistanos afirmaram que deixariam de usar o carro se tivessem uma boa alternativa de transporte público.
A Lei de Mobilidade Urbana, política federal para os transportes que entrou em vigor em abril, coloca a equidade no uso do espaço público como uma das diretrizes do planejamento. Para especialistas, criar dificuldades para os carros e facilidades para o transporte coletivo é a receita para resolver o problema crônico de trânsito da cidade.

Uma dessas dificuldades é restringir a circulação, lançando mão de medidas como o pedágio urbano e a redução de estacionamentos.

O prefeito Gilberto Kassab (PSD) já declarou que São Paulo só pode aumentar as restrições aos veículos quando tiver linhas suficientes de metrô. Ao mesmo tempo, tramita na Câmara dos Vereadores um projeto de lei que cria a cobrança.

Preconceito

Por isso, embora a solução pareça tecnicamente simples, ela se mostra mais complicada política e culturalmente. "São Paulo tem classes média e alta elitizadas que acham que o ônibus não é para elas. Que é coisa de ralé", afirma Thiago Guimarães.

Por outro lado, o serviço oferecido pelos ônibus não tem nem qualidade nem velocidade suficiente para atrair mais pessoas, afirma. A velocidade média dos ônibus nos corredores da cidade foi de cerca de 15 km/h no horário de pico em 2011.

Para Flamínio Fichmann, urbanista especializado em transportes, "diminuir, com corredores bem projetados, o tempo de viagem dos ônibus pela metade teria o mesmo efeito que dobrar a frota". Com mais eficiência, o mesmo ônibus poderia fazer mais viagens por dia, levando mais gente.

Os corredores eficientes e velozes de que falam os especialistas tomariam parte do espaço dos carros por possuírem características que atualmente não são aplicadas em conjunto na cidade: têm espaço na pista para ultrapassagem nos terminais, pagamento do bilhete antes do embarque e parte dos cruzamentos com passagem sob a pista.

Para a gerente de planejamento da CET, Daphne Savoy, "incomodidades" do transporte coletivo, como o tempo de espera pelos ônibus e as trocas de veículos nos terminais, levam à opção pelo carro, que é um transporte "porta a porta".

"O transporte coletivo nunca vai lhe pegar em casa e deixá-lo onde você quer." Além disso, diz a gerente, "em qualquer país do mundo, você não tira o carro da pessoa. É uma coisa intrínseca, um objeto de desejo de qualquer ser humano".



quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Incentivos a carro elétrico e híbrido ficarão fora do regime automotivo



Por Marli Olmos - Valor 15/08
De São Paulo

O governo não incluirá incentivos para carros elétricos e híbridos no regime automotivo que está prestes a ser anunciado. Um programa específico será definido mais adiante. Com isso, a equipe econômica ganhará tempo para entender a infraestrutura necessária para a circulação de veículos com motor elétrico e, ainda, tentará arrancar das montadoras o compromisso de produzir esse tipo de automóvel no país.

A decisão levou em conta também a estratégia de primeiro lançar o programa que definirá o limite máximo de emissões de CO2 nos carros movidos a gasolina e etanol. Essa norma, que virá embutida no regime automotivo, será fiscalizada pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro).

Com um programa do controle de emissões, o governo ganha a simpatia da população. Faz mais sentido, sob a ótica da opinião pública, atestar o interesse do governo em criar um programa para reduzir emissões de automóveis já fabricados no país antes de conceder incentivos fiscais a modelos que mal foram apresentados ao mercado.

A decisão frustra, no entanto, os fabricantes que fizeram lobby pela redução de impostos nos modelos híbridos e elétricos. Segundo fontes, o governo tenta, agora, negociar com as montadoras o compromisso de fabricar esses veículos no país. A ideia inicial é condicionar eventual pacote de incentivos fiscais à promessa de investir em linhas de produção.

Segundo fontes, a presidente Dilma Rousseff demonstrou, nas conversas com a indústria, preocupação com a questão da infraestrutura para os modelos 100% elétricos, que necessitam de pontos para recarga em áreas públicas.
Esse não é o caso dos híbridos, equipados com dois motores, um a combustão, que normalmente funciona com gasolina, e um elétrico, alimentado pelo outro motor. Nas conversas com Dilma, as montadoras interessadas em vender esses carros garantiram estar prontas para adaptá-los para funcionar também com etanol.

A Toyota, que se prepara para começar a vender seu híbrido Prius no Brasil nas próximas semanas, esperava contar com redução de impostos desde já. Mesmo assim, decidiu trazer o modelo mesmo sem o benefício fiscal.

Como a atual legislação do IPI se baseia em motores a combustão, os que estão fora dessa categoria - como os próprios híbridos ou elétricos - são taxados com as alíquotas mais elevadas. A recente elevação do IPI para veículos importados elevou ainda mais a carga tributária nesse tipo de veículo. A soma de tributos chega a até 120%.

Segundo informações da Toyota, o preço do Prius no Brasil, que deverá ficar em torno de R$ 130 mil, não inclui margem de lucro. Trata-se de uma estratégia, segundo a montadora, para atrair no brasileiro o interesse no primeiro veículo híbrido produzido em larga escala no mundo. O Prius foi lançado no Japão há 15 anos. Três anos depois já estava na América do Norte e Europa. A Toyota vende 16 modelos híbridos em quase 80 países.

Como o interesse da Toyota se concentra nos híbridos seus representantes têm tentado convencer os técnicos do governo de que o uso desse tipo de veículo não depende de infraestrutura, ao contrário do carro totalmente elétrico. Mas a última geração do Prius, vendida nos países desenvolvidos, já usa tomada. Chamada de plug-in, a versão acrescenta uma fonte externa de carregamento para garantir mais autonomia só com eletricidade.

Já o grupo Renault-Nissan e a Mitsubishi estão interessados na venda de carros totalmente elétricos, que dependem apenas da bateria recarregável. Esses veículos já rodam no Japão e Europa há cerca de dois anos. A alemã BMW , que se prepara para investir na sua primeira fábrica no Brasil, também tem interesse na redução de impostos para carros elétricos.

Seja em defesa do híbrido ou do elétrico, como o objetivo é obter benefícios fiscais para a importação, os representantes dessas marcas têm se mantido unidos nas negociações com o governo.

Do lado oposto, estão as montadoras veteranas, que detêm as maiores fatias do mercado brasileiro. Essas empresas não têm pressa em obter vantagens fiscais para híbridos ou elétricos. E têm sustentado, nas conversas com o governo, que a tecnologia que permite abastecer os automóveis com o etanol, garante ao Brasil vantagem em relação aos países que investigam energias alternativas.

Os representantes da indústria que defende redução de tributos para veículos movidos a eletricidade não estão, no entanto, totalmente desanimados. Segundo fontes, os ministérios envolvidos na discussão - Fazenda, Desenvolvimento e Ciência e Tecnologia - desta vez estão alinhados com a ideia de criar uma forma de inserir o país no cenário das novas fontes de energia para a mobilidade. O que atrapalha é a agenda, apertada nos últimos dias por conta de outras muitas questões que envolvem o regime automotivo.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Veículos - Vendas em queda, custos em alta e uma variação cambial desfavorável a resultados em moeda estrangeira



Valor 03/08


Vendas em queda, custos em alta e uma variação cambial desfavorável a resultados em moeda estrangeira. Com essa ingrata combinação de fatores, o Brasil - menina dos olhos nos tempos de vacas magras em mercados desenvolvidos - passou a pesar nas finanças de alguns dos maiores grupos automotivos do mundo.

Balanços divulgados nos últimos dias pelas gigantes americanas Ford e General Motors (GM), além da italiana Fiat, mostram quedas de receita, margens e lucro em operações na América do Sul, nas quais o Brasil representa o maior mercado e a sede das filiais na região.

Os números apresentados por essas empresas repercutem as dificuldades enfrentadas por elas na primeira metade deste ano: desde as restrições de crédito que abalaram o mercado brasileiro até o impacto de medidas protecionistas do governo argentino sobre o comércio exterior - atingindo linhas de montagens dependentes de autopeças importadas, sobretudo do Brasil.

O cenário - que também inclui custos de estoques nas alturas - começou a mudar em junho, na esteira dos incentivos lançados em Brasília para reanimar as vendas de carros, como o corte no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).

O estímulo, contudo, não foi suficiente para reverter a queda dos resultados financeiros na região, que só não foram piores do que as problemáticas operações na Europa, afundadas na crise que assola o continente.

O desempenho negativo bate também nas remessas de lucro ao exterior, em forte queda em 2012. Depois do recorde no ano passado - quando as montadoras despacharam US$ 5,58 bilhões para suas matrizes -, o envio de ganhos da indústria automobilística recuou 72% no primeiro semestre, somando US$ 845 milhões, segundo dados do Banco Central (BC).

Na quarta-feira da semana passada, a Ford adiantou que sua rentabilidade na América do Sul será, neste ano, significativamente menor do que em 2011. A montadora citou o ambiente de negócios mais competitivo - que pressiona os preços - e a desvalorização cambial entre os fatores que justificam a previsão mais pessimista.

No primeiro semestre - em meio à queda de 4,8% dos volumes de veículos vendidos na região e custos elevados -, a Ford reportou um recuo de 9,6% no faturamento da filial sul-americano, para US$ 4,7 bilhões. Nos seis meses, o lucro operacional antes de impostos somou apenas US$ 59 milhões, muito abaixo dos US$ 477 milhões de um ano antes, com a margem operacional cedendo de 9,1% para 1,2%.

Ontem, foi a vez de a General Motors (GM) soltar seus números, que mostram, na América do Sul, lucro antes de juros e impostos (Ebit, na sigla em inglês) de US$ 64 milhões durante os seis primeiros meses do ano - menos da metade dos US$ 147 milhões do mesmo período de 2011.

Ainda na base de comparação anual, a GM sul-americana registrou queda de 1,7% na receita, para US$ 8,1 bilhões, ou 10,8% do resultado global de US$ 75,4 bilhões. A GM também relatou uma retração de 9,4% na produção de veículos na região - totalizando 433 mil unidades - e perda de participação de mercado: de 19% para 18,2%.

Os resultados da Fiat também foram apertados pela queda de 3,5% nas vendas de sua subsidiária na América Latina, que exclui o mercado mexicano.

Quando se coloca na conta os números da controlada americana Chrysler, o balanço do grupo italiano nessa região mostra recuo de 28,1% no lucro operacional medido pelo Ebit, para € 473 milhões no primeiro semestre. Já a receita líquida cedeu 4,7%, totalizando € 5,2 bilhões no período.

Além dos menores volumes, altas de custos industriais, despesas administrativas e preços mais apertados levaram o resultado da Fiat na América Latina para € 238 milhões durante o segundo trimestre, com queda de 32,4% em um ano.

A alemã Volkswagen, contudo, parece conseguir remar contra essa série de resultados negativos. De janeiro a junho, a receita da empresa na América do Sul somou € 8,56 bilhões, 21,5% acima dos 7,04 bilhões de um ano antes. O resultado segue evolução de 2,6% das vendas de veículos na região.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Montadoras vivem guerra de preços no estagnado mercado europeu



Por Assis Moreira - Valor 02/08
De Genebra

A compra de um novo automóvel pelo suíço Georg Buehler, um pedagogo de 53 anos, ilustra o acirramento da guerra de preços praticada entre montadoras na Europa e acusações de aprofundar as perdas da indústria automotiva.
Buehler ganha bem sua vida mas nunca quis gastar dinheiro comprando carro zero quilômetro, já que os usados vendidos na Suíça são bem conservados e o preço é sempre muito mais baixo. Mas recentemente ele mudou de ideia.
Em 2006 ele desembolsara 9.800 francos suíços (R$ 20,6 mil) por um modelo Volkswagen com 166 mil quilômetros rodados. Agora, com o carro já nos 236 mil quilômetros, decidiu trocá-lo por outro usado com algo entre 40 mil a 60 mil quilômetros rodados, que viu poder custar entre 12 mil francos (R$ 25,2 mil) e 18 mil francos (R$ 37,9 mil).

Mas Buehler descobriu logo as ofertas mirabolantes das revendedoras de carros novos. Constatou que um modelo menor da Renault, um Clio, poderia sair mais barato do que o custo de oficial de 21.500 francos suíços (R$ 45,3 mil).

O revendedor do automóvel frances perto de Berna, a capital suíça, ofereceu-lhe vários abatimentos: de 4 mil francos (R$ 8,4 mil) supostamente em razão do franco valorizado em relação ao euro; de 1.000 francos (R$ 2,1 mil) porque queria acabar o estoque do modelo; e um terceiro desconto disfarçado ao pagar 1.500 francos (R$ 3,2 mil) pelo seu Volks velho, que outros revendedores diziam não valer mais nem um centavo.

No fim das contas, Buehler obteve 30,2% de abatimento e só pagou 16 mil francos suíços (R$ 33,7 mil) - menos do que um modelo de usado que pensara em comprar. "O modelo novo é menor, mas foi um bom negócio sair com um carro zero quilômetro", conta ele.

Na verdade, algumas montadoras vem dando redução de até 35% no preço, segundo um porta-voz da Fiat, Richard Gadeselli, disse ao Valor. E mesmo com os abatimentos atrativos, as vendas de carros na Europa caíram 6,8% no primeiro semestre, comparado ao mesmo período do ano passado.

Sergio Marchionne, principal executivo de Fiat, descreveu o mercado automotivo europeu de "banho de sangue de preços" e "banho de sangue nas margens", no que alguns analistas viram ironicamente uma momentânea perda de gosto dele pela economia de mercado e a livre concorrência.

Também presidente da Associação Europeia de Construtores Automotivos (Acea), Marchionne alvejou especialmente o grupo alemão Volkswagen de explorar a crise para ganhar fatias de mercado com uma política de abatimentos "agressiva e ruinosa".

A direção da Volkswagen reagiu duramente, exigindo que o patrão da Fiat se demita da presidência da Acea, que reúne os produtores europeus. "As declarações de Marchionne mostram mais uma vez uma total incompetência", disse um porta-voz alemão na imprensa local.

Segundo a Acea, cerca de 12,4 milhões de veículos serão vendidos na Europa este ano - são três milhões a menos do que em 2007, o anterior ao começo da crise financeira global.

Somente os alemães Volks, Daimler e BMW aumentaram sua fatia no mercado deprimido europeu. Seus resultados positivos contrastam com as perdas bilionárias de rivais como PSA Peugeot-Citroën, Ford, GM e outros.

Sem surpresa, o confronto entre as montadoras aumentou em meio a deterioração econômica. Principalmente entre as montadoras em boa situação, como os alemães, e a Fiat e os franceses em dificuldade. Mas parece difícil atribuir a um só construtor os problemas do setor. A realidade é que a industria automotiva europeia tem um enorme problema de excesso de capacidade.

Para certos analistas, a industria automotiva europeia estaria operando com apenas 60% de sua capacidade, quando para serem lucrativas deveriam utilizar pelo menos 75% de sua capacidade. O excesso de capacidade é particularmente nocivo para um setor que continua a ter altos custos enquanto o faturamento declina.

As cifras podem ser bem piores para alguns fabricantes, incluindo as fábricas da Fiat na Itália. Já no caso de BMW e Mercedes, operam próximo da capacidade, graças por exemplo ao sucesso de exportações de modelos de alta qualidade para mercados em expansão como a China.

O excesso de capacidade na Europa pode ser similar a crise que quase provocou o colapso da industria automotiva nos EUA. A diferença é que Ford e GM se recuperam bem após 2009, enquanto na Europa a situação parece mais complicada para ser resolvida.

Montadoras europeias atacam agora também o acordo de livre comércio UE-Coreia do Sul. Nissan e Toyota aumentaram sua fatia no mercado europeu, provocando acusações de práticas desleais.

Além disso, fabricantes europeus pressionam a Comissão Europeia, braço executivo da UE, para prorrogar sua norma de redução de emissões de gases.

Até ontem, Marchionne continuava na presidência da Acea. "Não se falou em sua saída, seu mandato vai até o fim do ano', disse um porta-voz da associação. Também a Fiat procura agora minimizar as declarações do patrão. Um porta-voz insiste que na verdade Marchionne não fez acusação direta a Volks.

Quanto ao grupo alemão, não retirou sua exigência contra Marchionne. E analistas lembram que a Volks está sempre pronta para comprar a Alfa Romeo, o que já causou tensões com a Fiat no passado.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Vendas de carros têm o melhor julho da história



Por Eduardo Laguna - Valor 01/08
De São Paulo

Ainda no embalo da redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) - anunciada no dia 21 de maio -, a indústria automobilística mantém o ritmo de recuperação, marcando em julho, conforme apontam estimativas, o segundo melhor desempenho na história.

Até a segunda-feira, os emplacamentos somaram 329,5 mil carros, o que - ao superar as 287,9 mil unidades de um ano antes - já configura o melhor julho de todos os tempos.

Ainda faltam os emplacamentos de ontem - último dia do mês, quando as marcas tradicionalmente correm para melhorar os resultados. Mas a expectativa é que o mercado feche julho com volume ao redor de 350 mil automóveis e utilitários leves vendidos, no desempenho mais positivo em 19 meses e chegando perto dos 361,2 mil carros de dezembro de 2010 - o melhor mês das montadoras na história.
Os números preliminares foram compilados pela consultoria Oikonomia, especializada no setor automotivo. O resultado oficial da Fenabrave - a entidade que reúne as concessionárias - está previsto para a tarde de hoje. Já na segunda-feira será a vez de a Anfavea - entidade que abriga as montadoras instaladas no país - divulgar seu balanço de vendas, produção e exportações.

A recuperação do mercado começou em maio e foi turbinada nos dois meses seguintes pelo pacote de estímulo à indústria, que combinou incentivos fiscais e medidas para destravar o crédito - caso do corte do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para pessoa física e da liberação de depósitos compulsórios para a geração de financiamentos a veículos.

Resolvida em junho a delicada situação dos estoques - que chegaram a mostrar nível mais crítico desde a crise financeira de 2008 - a recuperação das vendas também abriu espaço para uma retomada da produção no mês passado.

A despeito do esvaziamento em São José dos Campos (SP) - onde uma linha de montagem corre risco de fechamento -, a General Motors (GM) voltou a ter jornada extra de trabalho em sábados alternados na unidade de São Caetano do Sul, no ABC Paulista. Em Gravataí, no Rio Grande do Sul, a montadora também funciona em pelo menos um sábado por mês, informa o diretor de assuntos institucionais da GM, Luiz Moan. O executivo diz que, desde maio, os estoques da General Motors caíram de 43 dias para um giro de 28 dias.

Com medidas que vão de paradas pontuais a férias coletivas - passando pela suspensão de contratos de trabalho na Mercedes-Benz -, as montadoras tentavam desde setembro do ano passado a ajustar a atividade das fábricas para adequar o nível de veículos parados nos pátios.
No fim de junho, o setor conseguiu regularizar seus estoques, para um patamar equivalente a 29 dias de venda. Em maio, estavam em 43 dias.

Para atender ao crescimento da demanda, a Fiat anunciou recentemente a contratação de 600 operários para elevar a produção de sua fábrica em Betim (MG) em 150 carros por dia.

"Sem dúvida, já acontece uma melhora da produção", comenta Moan, acrescentando que a reação também está ligada à menor entrada de importados após os obstáculos colocados pelo governo.

A recuperação também já começa a ser notada em alguns setores da indústria de autopeças, que reportam aumento nas programações de compra das montadoras. "Desde junho, notamos uma recuperação importante. Houve um avanço de 15% a 20% nos pedidos", relata Eduardo Buchaim, diretor de vendas da fabricante de componentes de motor Dayco.

A melhor fluidez nas liberações de crédito, combinada a campanhas promocionais das montadoras, é citada por analistas entre os fatores que estão permitindo a virada da indústria automobilística. Em julho, também houve a influência do maior número de dias úteis: dois a mais do que junho.

Na iminência de uma corrida dos consumidores às lojas - dada a possibilidade de término dos incentivos fiscais em 31 de agosto, como promete o governo -, existe a expectativa de novo crescimento neste mês. "Historicamente, agosto tende a ser 5% melhor do que julho", diz Raphael Galante, analista da Oikonomia.