quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Em ano recorde, vendas de carros aceleram no Sul



Por Eduardo Laguna - Valor 28/12
De São Paulo

Apesar da estiagem que atingiu o Rio Grande do Sul neste verão, trazendo incertezas sobre a produtividade das lavouras, os agricultores gaúchos, quando olham para trás, têm poucos motivos para reclamar dos resultados da última safra.

Em meio a um cenário de demanda aquecida na Ásia e preços em alta, os embarques ao exterior de soja - principal item da pauta de exportações do Estado - subiram 63% e alcançaram, em valores, US$ 2,85 bilhões no período de janeiro a novembro.

No mesmo período, as exportações gaúchas de trigo cresceram mais de cinco vezes, enquanto as de milho em grão avançaram 32,3%. Favorecidas por ganhos de produtividade nas mais importantes culturas de lavoura, a agropecuária do Rio Grande do Sul cresceu expressivos 18,8% neste ano e ajudou a puxar uma expansão de 5,7% da economia do Estado, conforme dados preliminares do governo estadual.

Além de representar um alívio ao desempenho oscilante da indústria gaúcha, esses números ajudam a compor o pano de fundo do crescimento registrado neste ano pelas montadoras de carros, que se agarraram à demanda surgida em polos do agronegócio no país para renovar recordes de venda.

Embora o grande consumo de veículos esteja no Sudeste, foi no Sul que as vendas de carros novos cresceram mais rápido em 2011. Só no Rio Grande do Sul, quinto maior mercado automobilístico nacional, houve um avanço de 9,6%, mais de duas vezes o desempenho médio do mercado nacional - 4,3%.

Nos demais Estados da região - Santa Catarina e Paraná -, o crescimento foi da ordem de 7,35% e 8%, respectivamente. O levantamento foi feito pela consultoria automotiva Oikonomia e considera as vendas de automóveis e veículos comerciais leves. O seja, os números excluem caminhões, ônibus e motos.

Em 2011, o Sul passou a ter mais de 19% das vendas realizadas em todo o país, sendo a única região a ganhar participação de mercado. "A região sul foi a única que cresceu acima da média e, assim, 'roubou' participação das demais regiões", diz o consultor Raphael Galante, responsável pelo estudo.

Outras regiões onde há predomínio do agronegócio - setor que já salvou a economia brasileira de uma contração no terceiro trimestre - ou exposição à forte demanda asiática por commodities industriais também viram o volume de emplacamentos subir mais intensamente.

No Mato Grosso, maior produtor de soja do país, as vendas de carros cresceram 11,7%. Já em Minas Gerais, segundo maior mercado automobilístico brasileiro, o crescimento também foi expressivo: da ordem de 6,8%. Já no Espírito Santo, o volume de emplacamentos cresceu 5,8%.
São resultados bem superiores ao aumento de 2,65% registrado em São Paulo - onde está um quarto dos veículos vendidos no país - ou no Rio de Janeiro, terceiro maior mercado, cujas vendas avançaram 3,7% neste ano.

Galante chama a atenção para o fato de que a ascensão desses mercados é acompanhada pelo consumo de automóveis de maior valor agregado. Marcas como Renault, Hyundai e Peugeot - que não estão entre as mais baratas - apresentam penetração mais forte no Rio Grande do Sul do que em outras regiões. No Mato Grosso, a participação de mercado da Toyota - fabricante da picape Hilux, objeto de desejo entre empresários mais abastados do campo - é de 5,75%, bem acima do percentual de 2,75% no mercado nacional.

Ante a consolidação de mercados nas grandes capitais, a indústria se vê diante do desafio de explorar novas fronteiras para seguir crescendo de forma sustentável nos próximos anos. Diversas regiões que hoje apresentam volumes muito baixos indicam um enorme potencial de crescimento. O problema é identificar exatamente onde estão esses mercados e, mais importante, saber qual é o momento certo de entrar neles.

A consultoria Escopo, que faz análises de mercado para montadoras, tenta diariamente matar essa xarada com mapas que buscam mostrar para onde o mercado está indo. A partir do cruzamento de dados sobre crescimento da economia regional com variáveis de renda e densidade demográfica já chegou à conclusão de que as vendas no norte do Maranhão, por exemplo, devem mais do que dobrar até 2020, chegando a 83 mil carros por ano.

Seja pela utilização do automóvel ainda relativamente baixa, seja pelo crescimento do consumo ou pelo volume de novos investimentos direcionados à região, o Nordeste é geralmente apontado como o mercado mais promissor pela indústria. Não à toa montadoras como a Fiat e a chinesa JAC Motors decidiram se instalar em Pernambuco e na Bahia, respectivamente.

De acordo com estudo da Escopo, o mercado de carros nordestino deverá crescer a um ritmo anual de 4,7% nos próximos cinco anos, acompanhado por um avanço parecido - de 4,5% ao ano - no Centro-Oeste.

As estimativas para o Sudeste até 2016 apontam para um crescimento de 3% ao ano. Para o Sul, a consultoria prevê um aumento anual de 3,3%, enquanto o Norte deverá avançar 4,8% ao ano, mas sobre uma base muito mais fraca de comparação.

Geraldo Ferreira, diretor da Escopo, diz ser pouco provável que o Nordeste passe o Sul nos próximos anos, mas lembra que o surgimento de novos centros de consumo exigirá um reforço da atuação das montadoras em regiões ainda pouco exploradas.

Segundo ele, para atender a um mercado que vai crescer a uma taxa anual de 3,5% nos próximos cinco anos, serão necessárias mais 653 revendas no país, sendo 192 delas no Nordeste e 154 no Centro-Oeste. A maioria das lojas, contudo, continuará sendo inaugurada no Sudeste, que precisará abrigar mais 237 pontos de venda no período.

O desenvolvimento da rede de concessionárias no Nordeste está por trás do avanço de algumas marcas chinesas no Brasil. Só neste ano, a CN Auto - que importa as vans Towner e Topic - abriu cinco concessionárias na região, conforme dados coletados pela Abeiva, entidade que abriga as importadoras de veículos, até outubro.

No mesmo período, a Chery, que ergue uma fábrica em Jacareí, no interior de São Paulo, abriu três revendas no Nordeste e colocou a região, junto com o Norte, no centro da estratégia de desenvolvimento da rede de distribuição. Por sua vez, a JAC Motors já está com sete concessionárias espalhadas por Bahia, Pernambuco, Alagoas, Maranhão e Rio Grande do Norte.

Ferreira lembra, no entanto, que mais importante do que ampliar o número de lojas é saber onde instalá-las. Em grandes mercados, como a Grande São Paulo, o ideal é que as revendas estejam a uma distância média de quatro a cinco quilômetros do consumidor. "Não adianta ter muitos pontos se isso não for feito com qualidade. É preciso oferecer conveniência ao consumidor", adverte o executivo.


segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Montadora de carros sueca Saab anuncia falência

Bloomberg


ESTOCOLMO — A montadora de automóveis Saab, da Suécia, pediu falência nesta segunda-feira à Justiça, após seguidas tentativas de obter financiamento e salvar a marca nos últimos anos. O processo de falência vai tramitar no Tribunal de Vänersborg. Desde setembro, a empresa estava em recuperação judicial, mas falhou em obter capital de investidores para honrar dívidas e manter viável a operação da empresa.

A montadora foi criada há 64 anos como uma divisão da indústria Saab, fabricante sueca de aeronaves e produtos militares. A separação da divisão aeroespecial ocorreu no início dos anos 90, mas o nome foi mantido. Sócia-controladora da Saab desde a década de 90, a americana General Motors (GM) vendeu o controle à companhia holandesa Swedish Automobile NV em fevereiro de 2010, mas manteve uma participação minoritária na montadora sueca.

A controladora da Saab, Swedish Automobile, planejava que a montadora sueca vendesse 120 mil veículos e se tornasse lucrativa em 2012. Mas informou em comunicado que a falência teve de ser declarada devido à insolvência inevitável da empresa, porque a GM vetou uma tentativa de obter capital de investidores chineses. A montadora tentava obter € 600 milhões em empréstimos do grupo chinês Zhejiang Youngman Lotus Automobile, em troca de uma participação societária.

“Lutamos muito. A Saab é parte da história da indústria sueca e seria um grande impacto não apenas ao país se a empresa terminasse”, disse o diretor de desenvolvimento de produtos da Saab, Mats Faegerhag à Bloomberg.

A GM, que também é fornecedora da tecnologia da companhia, informou que não aprovaria soluções alternativas de financiamento à empresa. A companhia americana informou que bloquearia qualquer tentativa de aporte financeiro pelo grupo chinês Zhejiang Youngman Lotus. Segundo o jornal britânico “Financial Times”, a GM estava preocupada em preservar suas patentes e evitar uma transferência de tecnologia para a China, já que alguns modelos da Saab são baseados em tecnologia da GM.

Oficialmente, a empresa americana diz que não aprovaria mudanças prejudiciais aos seus interesses na divisão societária da Saab.

“Essa proposta resultaria diretamente ou indiretamente em transferência de controle da Saab de uma maneira que seria prejudicial para a GM e seus acionistas. Desse jeito, a GM não pode aprovar nenhuma das soluções alternativas”, informou a GM.

A Saab tem 3.600 funcionários, sendo 3.400 na sede em Trollhättan.
A produção da companhia foi suspensa em março, quando não conseguiu pagar fornecedores. Os salários dos trabalhadores foram atrasados diversas vezes e ainda trabalhadores ainda precisam receber o salário de novembro.

A falência vai encerrar dois anos de tentativas de manter a Saab viva. Segundo documentos entregues ao Tribunal de Vänersborg, a empresa tem equipamentos avaliados em US$ 432,5 milhões, que podem ser vendidos para pagar credores.



sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

China vê 'tarifa excessiva' para carro no Brasil



Por Assis Moreira - Valor 16/12
De Genebra

O ministro de Comércio da China, Chen Deming, disse ontem que a decisão de novos investimentos chineses na indústria automotiva no Brasil será das empresas, baseada na análise do mercado e não uma decisão de governo, no que foi interpretado como uma maneira de sinalizar sua insatisfação com a situação do setor no país.

"Você não sabe que recentemente o Brasil levantou as tarifas para os carros?", acrescentou, depois de falar em "tarifas excessivas", e no que parecia se referir à elevação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) em 30 pontos percentuais para os carros que tiverem menos de 65% de conteúdo nacional.

"Espero, porém, que na próxima vez você esteja dirigindo um carro chinês", completou o ministro na resposta ao Valor, ontem em Genebra, à margem da conferência ministerial promovida pela Organização Mundial do Comércio (OMC).

Em Genebra, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, considerou quase como certo que novos construtores chineses vão se instalar no Brasil, atraídos pela evolução do mercado e que só estariam esperando as regras do novo regime automotivo que vigorará a partir de 2013.

Já outros conhecedores da questão duvidam que tão cedo os chineses ampliarão os investimentos na indústria automotiva brasileira, diante do aborrecimento demonstrado com a alta do IPI no Brasil, que atinge essencialmente os carros importados da China e da Coreia do Sul.

Ao mesmo tempo, o Brasil foi um dos país indiretamente atacados ontem, quando 23 membros da OMC, incluindo União Europeia, Estados Unidos, Japão, Canadá, México, Chile, Colômbia e Austrália, defenderam um pacto "antiprotecionismo".

Brasil, China, Índia e África do Sul, entre outros países, rechaçaram esse pacto porque acham que só propõe o congelamento das tarifas de importação, mas não dos subsídios e de outras medidas de proteção que os desenvolvidos adotam.

Ao mesmo tempo, Deming defendeu a aplicação de sobretaxas impostas por Pequim contra a entrada de carros grandes dos Estados Unidos em seu mercado, e que aumentou a tensão comercial entre os dois países.

Deming insistiu que é preciso se fazer distinção entre medidas protecionistas e instrumentos normais de defesa comercial. "Nossas medidas são consistentes com as regras da OMC", disse ele, usando o mesmo argumento de Pimentel para defender a alta do IPI no Brasil.

O ministro chinês admitiu que as exportações chinesas estão tendo cada vez mais dificuldades nos mercados desenvolvidos em plena deterioração econômica. As vendas para os Estados Unidos, União Europeia e Japão representavam 60% do total no ano passado e este ano só representam 45%.

Ou seja, os chineses estão buscando mais os mercados emergentes para seus produtos. Mas Deming reconheceu os riscos de fricção e afirmou que por isso mesmo Pequim tenta refrear a aceleração das exportações para esses países.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Montadoras estocam caminhões


Valor 13/12
A indústria acelerou o ritmo de produção de caminhões nos últimos meses, prevendo a antecipação de encomendas que naturalmente ocorre em véspera de mudança de legislação de emissões. Mas, ao contrário do que se esperava, houve queda de vendas nos três últimos meses. Enquanto as montadoras mantiveram a produção mensal média em 19,5 mil unidades durante todo o segundo semestre - a mais alta de um ano já aquecido, o volume de vendas começou a diminuir e chegou a novembro com 13,5% inferior ao do início do semestre, menor também do que o do que há um ano.

A antecipação de encomendas ocorre em todo o mundo sempre que a legislação de emissões muda. A partir de janeiro, caminhões e ônibus fabricados no Brasil deverão seguir a norma do Programa de Controle de Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve) P 7, que equivale à europeia Euro 5. A indústria esperava uma antecipação de compras ainda mais intensa que nas mudanças de legislação anteriores, porque desta vez o aumento de preços será elevado - de 6% a 20%, dependendo do veículo -, refletindo o custo de uma tecnologia mais cara.
A crise nos mercados internacionais e o crescimento zero do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro no terceiro trimestre podem ter feito o frotista, que pensava em antecipar a troca de veículos, recuar, segundo avaliação dos representantes da indústria. No entanto, mesmo com os sinais de retração dos pedidos em setembro, o ritmo acelerado de produção foi mantido.

A produção desse estoque extra poderia ser um problema para a indústria se o país não estivesse na véspera de mudança na regra de emissões. A legislação permite às montadoras vender até 31 de março de 2012 caminhões e ônibus produzidos este ano. Isso significa que os frotistas terão ainda três meses para comprar caminhões com motores ajustados à regra do Proconve P5 (ou Euro 3), em vigor até 31 de dezembro deste ano.

Ao mesmo tempo, a indústria ganhará tempo para tentar obter uma linha especial do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), exclusiva para os novos caminhões mais caros. Fontes ligadas ao setor informam que os técnicos do BNDES estariam aguardando sinais do tamanho da demanda por esses novos recursos. As taxas mais baixas nessa linha especial compensariam o aumento de preços e o valor mais alto do diesel, que também muda no veículo novo.

A venda interna de caminhões estava em torno de 14 mil a 15 mil unidades por mês até o fim do primeiro semestre. Caiu para 13,4 mil em novembro. A diferença equivale praticamente a um mês de exportações do setor.

O quadro indica que a nova legislação de emissões vai estrear num cenário bastante desequilibrado. A produção tende agora a cair, já que a maior parte dos fabricantes concederá férias coletivas. Ao mesmo tempo, as vendas podem subir no primeiro trimestre porque muitos transportadores vão querer aproveitar para comprar caminhões em estoque e, assim, fugir do aumento de preços. A expectativa de liberação de linha de crédito especial, por outro lado, poderá paralisar o mercado.

Na média, a indústria já espera que 2012 será mais difícil do que 2011. A projeção da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) é um mercado que pode empatar com o de 2011 na melhor das hipóteses ou cair até 10%. "A queda no mês passado causou surpresa", diz o vice-presidente da Anfavea para a área de caminhões, Marco Saltini.

Depois de um ano de vendas recordes, a Iveco prevê um 2012 de estagnação. A empresa trabalha com cenário de crescimento zero nas vendas em relação a este ano e prevê uma retomada só a partir de 2013. A avaliação é do presidente da Iveco para a América Latina, Marco Mazzu. Para ele, mesmo para o setor de caminhões, que no Brasil tem exibido avanço consistente nos últimos anos, os reflexos da crise externa trarão um quadro de desaceleração no ano que vem.

A momentânea retração na demanda não é recebida com tanta preocupação, já que a queda de vendas tem como base períodos de recordes. Bernardo Fedalto, gerente de caminhões da Volvo, considera que, na média, 2010, 2011 e 2012 poderão ser considerados anos igualmente bons para a indústria de veículos pesados. "Se levarmos em conta que 2011 será bom e 2012 ruim voltaremos, na média, ao desempenho de 2010, que foi um ano fantástico para o setor", afirma. Para ele, a perspectiva de longo prazo leva os fabricantes a manter os investimentos em modernização e nacionalização.

"Se olharmos em perspectiva de médio prazo, os próximos três a cinco anos, enxergamos um mercado que continuará crescendo em função da macroeconomia sólida do Brasil, que ajuda a puxar a demanda por caminhões", diz Mazzu. Para ele, a construção civil, agronegócio e indústria são os principais clientes de caminhões no país e com o avanço dos projetos do pré-sal e a preparação para a Copa do Mundo e a Olimpíada, o setor deverá se manter aquecido.

Além disso, a recente sinalização do governo em favor do aumento de consumo, com a redução de IPI para a linha branca, animou o setor. A ponto de alguns já começarem a prever até algum crescimento em 2012.

Até eles, aliás, começaram a consumir mais. Saltini é um exemplo. Há um mês ele e a esposa pesquisaram preços de geladeiras e interessaram-se por uma de R$ 2,9 mil. O casal decidiu pensar. Mas a redução de IPI, em dezembro, mudou o cenário. Saltini e esposa voltaram à loja e pagaram R$ 2,1 mil pela geladeira. O desconto de 27,5% foi bom. Mas a perspectiva de os transportadores necessitarem de mais caminhões para entregar novas geladeiras o animou ainda mais.


Novo IPI para carros chega sem 'compensações'


Valor 13/12

A partir de sexta-feira, entra em vigor o decreto que eleva em 30 pontos percentuais o IPI dos veículos produzidos no Brasil que não atingirem conteúdo nacional mínimo de 65%. O governo não conseguiu, no entanto, concluir negociações com a indústria para ajustar a tempo questões importantes atreladas a essa medida.

Entre as pendências, falta escolher o mecanismo de transição para os novos investidores, que planejam começar a produzir, mas ainda não alcançaram o conteúdo nacional exigido. Os dois ministérios envolvidos - Fazenda e Desenvolvimento - tentam fechar as brechas para que as empresas com planos de investimento no Brasil cumpram as promessas de aumento de conteúdo local e não sejam obrigadas a pagar o IPI com alta de 30 pontos percentuais.

O governo teme a repetição de casos como o da extinta Asia Motors, a montadora coreana que aproveitou o regime automotivo no governo de Fernando Henrique Cardoso para importar com benefícios fiscais em troca da promessa, não cumprida, de erguer uma fábrica na Bahia.

Nos últimos dias, o ministro Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, teve encontros com todas as empresas que querem construir no país. Os representantes das chinesas Chery e Jac Motors, da japonesa Suzuki e da alemã BMW estiveram, separadamente, em seu gabinete com propostas que não receberam resposta.

Segundo fontes do setor privado, as equipes da Fazenda e do Desenvolvimento não conseguiram entrar em acordo. A Fazenda estaria menos disposta à flexibilidade, segundo fontes das montadoras. Um integrante da equipe do governo diz, porém, que os dois ministros concordaram em deixar para o Desenvolvimento a formatação das novas regras.

"Tínhamos visões diferentes; não temos mais", destaca a secretária de Desenvolvimento da Produção, do Ministério do Desenvolvimento, Heloísa Menezes. Uma reunião prevista para quarta-feira, com empresários do setor, deve ser cancelada para permitir aos técnicos dos dois ministérios avançar no trabalho. "Estamos discutindo alternativas que compatibilizem esse interesse em produzir no Brasil com o prazo necessário para isso", diz a secretária. "Projetos assim não se viabilizam em seis meses."

As montadoras já instaladas no país aplaudem as medidas protecionistas e, se no passado a redução de impostos era reivindicação constante, hoje o setor se contenta em ver o governo elevar a tributação dos concorrentes importados. "Não há negociação [para reduzir impostos] porque não vemos necessidade disso. O governo precisa de caixa e não vai abrir a mão da possibilidade de obter equilíbrio fiscal", disse recentemente o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Cledorvino Belini.

O governo também terá que lidar, ainda, com a mobilização das empresas que importam automóveis e não têm planos de produzir no país. A associação que representa esse grupo, a Abeiva, foi buscar a ajuda da Barral M Jorge Consultores Associados, uma consultoria especializada em relações governamentais que pertence ao ex-ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, e o ex-secretário de Comércio exterior, Welber Barral.

A associação não obteve, no entanto, progresso nas propostas de flexibilização do aumento de IPI por meio de importações autorizadas. O grupo se muniu de dados que mostram o aumento das importações das montadoras ligadas à Anfavea de veículos do México e Argentina, isentos do aumento do IPI em razão dos acordos bilaterais entre governos. Na comparação entre agosto e novembro, a participação das importações de empresas ligadas à Anfavea aumentou de 17,05% para 22,30%, segundo importadores.

Nos bastidores, as marcas que se mobilizam contra o aumento do IPI contam com a ajuda de governadores do Nordeste interessados em atrair as futuras fábricas. Os governadores da Bahia, Jacques Wagner, e de Pernambuco, Eduardo Campos, fizeram um pacto para pressionar o governo por maior flexibilidade para empresas interessadas em abrir instalações nesses Estados.

Tanto Wagner quanto Campos cobram da presidente Dilma Rousseff uma política de "recorte regional" e argumentam que, das 49 fábricas instaladas no país, 46 estão no Sul e no Sudeste e só duas no Nordeste. Na semana passada, o governador baiano voltou a tocar no assunto com a presidente.

Independentemente das medidas do governo nos próximos dias, a mobilização no setor vai prosseguir em várias frentes. Sob o comando do Sindipeças, a indústria de autopeças continuará questionando a regra de conteúdo local. Já as montadoras que produzem no Brasil e evocam seus programas de investimentos que somam US$ 22 bilhões até 2015, deverão, nos bastidores das negociações com os técnicos do governo, apelar para todas as ferramentas para justificar pedido de proteção. Entre as mais fortes, aparece um cálculo mostrando como a valorização do real consegue eliminar a proteção do Imposto de Importação.