sexta-feira, 9 de março de 2012

A moto elétrica

Valor 09/03

Em choque com os hábitos do consumidor brasileiro e à margem pela falta de uma política de incentivo ao setor, o mercado de motocicletas elétricas está longe de deslanchar no Brasil. Apesar do apelo ambiental, o produto ainda esbarra na baixa autonomia das baterias - de 50 a 70 quilômetros -, um ponto crítico em um país onde o condutor tem a cultura de utilizar veículos, mesmo de duas rodas, para percorrer longas distâncias.

Não poluidoras e silenciosas, as motos elétricas são com frequência apontadas como o futuro da indústria, mas, por enquanto, a Kasinski é a única entre as montadoras a desbravar essa tecnologia. Há mais de um ano, a empresa fabrica motonetas (scooters) movidas a baterias de lítio ou chumbo-ácido no polo industrial de Manaus.

Empresas que chegaram a apresentar protótipos ao público não se arriscam a entrar definitivamente no negócio. Entre elas, a Dafra, do grupo Itavema, ainda tem em fase de desenvolvimento uma scooter elétrica exposta em outubro no Salão Duas Rodas, realizado na capital paulista.

Por outro, as grandes fabricantes instaladas no país - Honda e Yamaha -, a produção dessas motos nem chega a ser um projeto no momento, embora protótipos sejam desenvolvidos pelas matrizes no Japão. Dona de quase 80% do mercado nacional de motocicletas, a Honda ainda prefere aproveitar a farta disponibilidade de etanol para investir no desenvolvimento dos modelos flex, já responsáveis por mais da metade das vendas da marca.

Os desafios colocados para a popularização das motos elétricas começam na falta de uma rede de abastecimento, passam pela inexistência de fornecedores locais de componentes ligados ao sistema elétrico e culminam na insuficiência de estímulos fiscais e de financiamento.

Hoje, a tecnologia vem, principalmente, da China, onde - em contraposição ao estágio embrionário na maior do mundo - já existe um mercado de motos elétricas bem estabelecido, com grande número de fabricantes locais.

Para entrar nesse negócio, a Kasinski se baseou na tecnologia da fabricante chinesa Zongshen - sócia do empresário brasileiro Claudio Rosa na produção de motocicletas da marca - e se aliou à distribuidora de energia Light na criação de uma empresa voltada à atuação no mercado elétrico, a CR Zongshen E-Power.

No momento, as companhias se debruçam no mapeamento dos pontos onde podem ser instaladas as unidades de abastecimento de energia e de descarte de baterias. Também estudam alternativas sobre como monetizar a energia fornecida pela Light às motocicletas: uma possibilidade é a emissão de cartões pré-pagos, que poderiam ser usados pelo usuário para "recarregar" o veículo fora de casa.

De açodo com Claudio Rosa, as vendas de motos elétricas da marca ainda são tímidas, girando hoje ao redor de 150 unidades por mês - o representa menos de 5% do volume total negociado pela montadora em janeiro (3,24 mil unidades).

Devido a limitações ligadas à autonomia das baterias, o produto é bastante procurado para a circulação em ambientes delimitados - como trabalhos de vigilância em estacionamentos e condomínios - e tem maior aceitação por empresas e instituições preocupadas em apresentar ações de sustentabilidade.

Já para o consumidor comum, a nova tecnologia ainda encontra resistência. "Está crescendo mais no setor corporativo e mostra uma evolução mais lenta para o público porque representa uma quebra de conceito na utilização de motos. É tudo uma questão de hábito e familiarização com o tipo do produto", acredita Rosa.

Estímulos fiscais, combinados a uma maior disponibilidade de crédito (no qual as restrições no segmento duas rodas costumam ser maiores do que no mercado de carros), são tidos como fundamentais para vencer a resistência e incentivar o desenvolvimento de motos mais potentes - hoje, a produção se restringe a motonetas.

Além da isenção dos impostos de importação para a montagem dessas motos na Zona Franca de Manaus, veículos elétricos contam atualmente com isenção do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) em sete Estados: Ceará, Maranhão, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Sergipe e Rio Grande do Sul. Em outros três - São Paulo, Rio de Janeiro e Mato Grosso do Sul -, existem alíquotas de IPVA diferenciadas.

Para Moacyr Alberto Paes, diretor-executivo da Abraciclo - a entidade que abriga os fabricantes nacionais de motocicletas -, a extensão dos benefícios tributários representaria um estímulo à aquisição de veículos não poluentes pelas pessoas, dentro de políticas de controle nas emissões de gases.

"O melhor subsídio é o incentivo tributário. O veículo produzido em Manaus tem uma carga de impostos menor, mas, por outro lado, existem custos com o frete que pressionam os preços. Quando houver incentivo fiscal e financiamentos, o consumidor certamente passará a optar por veículos elétricos."

Kasinski vai fazer bike elétrica


A Kasinski finaliza os últimos detalhes na montagem de equipamentos para começar ainda neste mês a produção na nova fábrica de veículos elétricos em Sapucaia, no Rio de Janeiro. Entre investimentos em ativos fixos e capital de giro, os desembolsos no empreendimento somam ao redor de R$ 120 milhões, tendo a Light como parceira no projeto.

Inicialmente, serão produzidas cinco versões de bicicletas elétricas, com preços que vão variar de R$ 1,8 mil a R$ 2,5 mil. No futuro, há planos de também produzir as motos elétricas no local, mas por enquanto essas linhas permanecerão na fábrica da Kasinski em Manaus. A capacidade instalada será de 10 mil unidades por mês.

Em relação ao tímido desenvolvimento das motos elétricas, espera-se uma evolução mais rápida do mercado de bicicletas elétricas. Mais baratas, elas também levam vantagem na autonomia - se a carga da bateria acabar, basta seguir pedalando.

O consumidor ainda pode, a depender da legislação de seu município, ficar livre de custos ligados ao registro e ao licenciamento, embora a habilitação seja obrigatória.

"O público da bicicleta vê na motorização elétrica um auxílio na condução do veículo. O produto atinge vários tipos de público", diz Claudio Rosa, sócio da chinesa Zongshen na Kasinski.

Não há dados sobre o tamanho do mercado elétrico, mas estimativas da Abraciclo apontam para vendas anuais de 5 milhões de bicicletas no Brasil.

Já as vendas de motos somaram a marca recorde de 2,04 milhões no ano passado. Para 2012, a expectativa da entidade é de crescimento de 5%. (EL)


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