sexta-feira, 30 de março de 2012

Em parceria com a Fiat, Chrysler volta ao país

Valor 30/03

A Chrysler voltará a produzir veículos no Brasil. O investimento poderá ser feito dentro de uma fábrica da própria Fiat, empresa que assumiu o controle da montadora americana depois que o governo dos EUA concedeu um empréstimo para salvá-la da falência. Segundo Sérgio Ferreira, o executivo nomeado pela Fiat para comandar a Chrysler no Brasil, os detalhes da operação dependem, agora, da política industrial a ser fixada no novo regime automotivo, a ser anunciado pelo governo nos próximos dias.

Detalhada por Ferreira, a estratégia do grupo não deixa dúvidas de que a opção pela produção local atende não só o mercado em expansão como a pressão do governo federal, que a cada dia aperta mais o setor, por meio de impostos e sistema de cotas, como tentativa de reduzir a importação. "Nenhuma das últimas medidas adotadas pelo governo favorece a importação; não conseguiremos ser competitivos se não produzirmos no Brasil", diz o executivo, que esta semana já teve uma reunião com o chefe de manufatura da Fiat para acertar os planos de produção. "Vamos ter produção local", destaca. O prazo para veículos Chrysler brasileiros chegarem ao mercado não está totalmente definido.

A lógica indica que a cidade de Goiana, em Pernambuco, pode a ser o destino do investimento da Chrysler. É nesse município que a Fiat começou a erguer a fábrica que consumirá investimento de R$ 4 bilhões e que aproveitou a última fase de benefícios fiscais de estímulo para o deslocamento da atividade automobilística para o Nordeste e Centro -Oeste. Fontes no governo confirmaram a existência de novos entendimentos com o grupo para acomodar a Chrysler em Goiana.

A Chrysler pode ser uma forma de Pernambuco compensar a perda do investimento de nova fábrica da Volkswagen, plano que chegou a ser discutido com o governo pernambucano. Negociações com o sindicato dos trabalhadores acabaram levando a Volks a optar pela ampliação da fábrica de Taubaté (SP). (Ver matéria abaixo).

Assim como a decisão do grupo Volks de ampliar a produção no Brasil o ajuda a avançar rumo à meta de ser líder mundial em 2018, também a expansão da Fiat, incluindo agora a Chrysler, representa mais um passo do plano de Sergio Marchionne, presidente mundial do grupo, de buscar alternativas à crise na Europa para estar entre os maiores grupos de fabricantes de veículos do mundo.

Ferreira não revela pistas das características do veículo que será fabricado no país, nem tampouco o volume de produção. Ocultar o tipo de veículo é estratégia de qualquer montadora. Já o tamanho da atividade, o executivo faz questão de ressaltar, está condicionada às regras que o governo determinará no novo regime automotivo. De qualquer forma, os volumes de produção de um veículo da Chrysler, que atua em faixa de preços mais altos - o mais barato vendido hoje no Brasil custa R$ 100 mil -, serão bem menores que qualquer meta da Fiat. A montadora italiana pretende produzir em Goiana mais de 200 mil carros por ano, a partir de 2014.

Acomodar uma linha de produção de um ou dois modelos Chrysler na gigantesca área, de 1,2 mil hectares, que a Fiat ocupará em Goiana é mais simples do que encaixar mais essa atividade na fábrica da Fiat em Betim (MG), que já foi inúmeras vezes reformulada para ampliar produção. Além disso, a localização no Nordeste simplifica o natural intercâmbio comercial com a região do Nafta, um velho sonho da Fiat.

Ferreira, um economista carioca que assumiu o posto, sem alarde, há um ano, está a cargo, agora, de preparar rede de revendas para o grande salto que a marca quer dar no Brasil com a decisão de produzir no país.

Uma das ações mais importantes foi a recente abertura de dois centros de distribuição de peças de reposição - um em Louveira (SP) e o outro na Argentina. Também essa ação foi cercada de discrição. O empreendimento em Louveira tem 4,5 mil metros quadrados e o de Buenos Aires, 3 mil. Com espaço adequado para armazenamento de componentes, a marca toma fôlego para o passo seguinte: a expansão da rede de concessionárias. Há hoje no Brasil 33 pontos de venda da marca americana. O plano é chegar a 50 este ano e até 120 até 2014.

Ter uma rede estruturada é um importante para qualquer marca de veículos se fixar num país. Mas no caso da Chrysler, o assunto é complexo. Somente agora a marca está conseguindo ter rede própria, separada da Mercedes-Benz. Essa é a última etapa de um longo processo de divórcio entre o grupo americano Chrysler e o alemão Daimler, unidas de 1998 a 2007.

É também da época desse casamento a segunda tentativa da Chrysler de produzir veículos no Brasil. Entre 1998 e 2001, a montadora americana fabricou a picape Dakota, em Campo Largo (PR). Ao desistir, teve de devolver incentivos fiscais. A primeira fábrica Chrysler no Brasil é da década de 60.

Agora, poucos meses depois que a Fiat elevou a participação acionária na Chrysler de 53,5% para 58,5%, com o governo americano ainda como sócio, a marca ganha fôlego para os planos de expansão nos países emergentes.

Já Ferreira começa a viver um velho sonho, de trabalhar na indústria dos automóveis. Sua carreira no setor já começou na fabricante de pneus Michelin . À época, a multinacional francesa o deslocou do Rio para comandar as filiais da Argentina e, depois, Grécia. Em 2008, foi contratado pelo grupo Fiat para assumir o comando da Case New Holland, a divisão de máquinas agrícolas, na América Latina. Ele mudou-se, então, para Curitiba e, depois, para São Paulo.

Agora no cargo de diretor geral da Chrysler, instalado no alto de um suntuoso edifício na Vila Olímpia, Ferreira cuida dos planos imediatos de elevar as vendas de 5,6 mil veículos em 2011 para 12 mil este ano. O lançamento de seis modelos somente no primeiro semestre pode ser uma boa explicação para a meta ambiciosa. Os volumes são baixos se comparados com o gigantismo da Fiat. Mas vencer com uma marca de luxo no mercado no qual já é líder é estratégico para a montadora italiana.

É também difícil entender como uma marca que traz apenas um modelo do México e todos os demais dos Estados Unidos e Canadá conseguirá dobrar vendas com o aumento de IPI em 30% para importados fora do Mercosul e México. Por enquanto, a empresa absorve boa parte desse custo adicional. Crescer é mais urgente.

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