A Bolívia possui as maiores jazidas de lítio do mundo. E o presidente da Bolívia sabe disso, o que pode por em risco o desenvolvimento de carros elétricos.
A Bolívia tem pouco mais da metade das reservas mundiais provadas de lítio, de acordo com o instituto americano Geological Survey. Além disso, as jazidas são de fácil acesso e razoavelmente rasas, o que facilita em muito sua extração, e muito próximas do oceano Pacífico, não mais que 50 a 80 km de distância em linha reta. Mas o país não possui fronteiras marítimas.
E Evo Morales sabe disso.
Ele sabe também que o futuro do carro elétrico, tão discutido e perseguido por todos os fabricantes de carro do mundo, reside justamente no oeste de seu país, mais precisamente na região conhecida como Salar Uyuni, a maior planície de sal do planeta. É um imenso deserto, cerca de 12.000 km² de área no Altiplano boliviano, com solo composto de uma mistura de salmoura e barro lacustre. Abrange dois departamentos (estados) e faz divisa com Chile e Peru a uma altitude média de 3.600 m. Dali praticamente brotam potássio, boro, magnésio e, o mais importante ultimamente, o lítio. Em sua maioria as jazidas estão a apenas dois a dez metros do nível do solo e muitas chegam a ter 120 metros de profundidade. É muito sal precioso.
Até aqui o cenário seria perfeito. Se o lítio, ingrediente fundamental para a produção de baterias fosse largamente explorado, poderia sair pelos portos do Chile, Arica e Altofagasta são os mais próximos, seguindo em linha reta, sem nenhum obstáculo até chegar ao Japão e Coreia do Sul, onde ficam os maiores fabricantes de baterias. Mas não é bem assim. Aí começam os problemas políticos, de cartel, independência econômica, de demonstração de poder, logística, e por aí afora.
Tudo é muito complicado. E Evo não quer vender o lítio tão barato, como a Bolívia já fez com o salitre, cobre, prata, estanho e vários outros minérios encontrados no país. Ao invés de exportar a matéria-prima, tem ambições de poder processá-lo.
Mas Evo sabe também que a Bolívia não tem tecnologia suficiente para isso. Levaria décadas para poder formar técnicos na transformação do lítio, e ainda assim ficariam anos-luz dos japoneses, por exemplo, que já estão muito avançados nesta tecnologia. Uma solução então seria se unir a outros países ou a grandes corporações. Japoneses e coreanos já deixaram bem claro que não exportam suas tecnologias nem mesmo para os Estados Unidos. Por outro lado, Evo Morales já afirmou que a Bolívia deve receber 60% do valor de cada bateria de íon de lítio comercializada.
E tem mais. Hoje, o Chile, juntamente com a Argentina, produzem quase a metade do lítio comercializado no mundo. Isso significa que o Chile não vai querer abrir seus portos para a Bolívia exportar seu metal pois haveria concorrência direta. Chile e Bolívia, aliás, sempre tiveram relações diplomáticas instáveis desde 1866. Em 1879 os dois países deflagraram a Guerra do Pacífico após o Chile ocupar o porto boliviano de Antofagasta. Em 1904 foi decretada a legalidade do Chile sobre os territórios ocupados e ambos assinaram o tratado de paz. Nunca mais houve guerra, mas amizade também não. A Bolívia perdeu seu acesso ao mar e seu povo nunca esqueceu o fato. Até hoje entram constantemente com ações junto à ONU para reaverem seu território e ainda mantém a Marinha da Bolívia na ativa navegando no lago Titicaca.
As baterias de íons de lítio são a maior aposta das montadoras para seus carros híbridos e elétricos. Muito embora a capacidade de armazenamento de eletricidade destas baterias seja de pouco mais de três vezes e meia a mais do que as de chumbo ácido descobertas em 1859. A diferença está no peso e no tamanho. Pode olhar a bateria de seu celular, de seu laptop, iPod e MP3, por exemplo, todos usam a nova tecnologia. E com os carros do futuro acontece a mesma coisa. O lítio é um metal leve que tem a metade da densidade da água. Dependendo de sua composição, é usado na fabricação de vidros, de analgésicos, antidepressivos, produtos cerâmicos, indústria aeronáutica e muitos outros produtos. Marcapassos cardíacos usam essas baterias.
Por outro lado, grupos japoneses como Sumitomo e Mitsubishi, e a francesa Bolloré já se mostraram interessadas em trabalhar na Bolívia. Só que querem contratos rígidos que não permitam em hipótese alguma que suas empresas corram o risco de serem nacionalizadas depois que estiverem funcionando, como já aconteceu em casos envolvendo até mesmo o Brasil, Argentina e outros países com o gás e petróleo. O que eles não querem é depender do humor do atual presidente. E Evo sabe disso.
Em recente entrevista na França, Evo afirmou que "O Estado nunca vai perder a soberania sobre o lítio. Quem quiser investir aqui tem que saber que o Estado deve ter o controle de 60 por cento dos ganhos."
O problema então do desenvolvimento e produção em massa dos carros elétricos passa, de qualquer maneira, pelas mãos de Evo Morales. E ele bem sabe disso. Só não sabe ainda como resolver. Se compra nova briga com seu vizinho Chile, caso decida vender apenas a matéria-prima, se aceita os termos dos grupos interessados na extração e produção local, ou simplesmente atravanca o futuro do carro elétrico.
E Evo sabe também que não pode deixar toda a fortuna que tem guardada em seu subsolo, enquanto o país tem um dos piores índices de desenvolvimento humano, baixa escolaridade e falta de água e esgoto tratado em boa parte da própria capital. O dinheiro do lítio poderia ajudar muito em benefício da população. Evo só não sabe como resolver esta equação.
Vamos ter que esperar então uma solução política sul-americana para resolver o problema mundial da dependência do petróleo e da poluição ambiental. Ou seja, tudo depende de Evo Morales. E ele sabe disso. Detalhe: o maior consumidor atual de baterias produzidas a partir do lítio são os Estados Unidos, desafeto confesso de Evo.
O Lítio e suas características
O lítio (do grego lithos, pedra) é um elemento químico de símbolo Li, número atómico 3 e massa atómica 7 u, contendo na sua estrutura três prótons e três elétrons. Na tabela periódica dos elementos químicos, pertencente ao grupo (ou família) 1 (anteriormente chamado 1A), entre os elementos alcalinos.
Na sua forma pura, é um metal macio, de coloração branco-prateada, que se oxida rapidamente no ar ou na água. É um metal leve, a sua densidade é apenas metade do que a da água.
O lítio foi descoberto por Johan August Arfwedson em 1817. Arfwedson encontrou o novo elemento nos minerais espodúmena e lepidolita provenientes de uma mina de petalita, na ilha de Utö (Suécia). Em 1818 Christian G. Gmelin foi o primeiro a observar que os sais de lítio dão uma coloração roxa brilhante a uma chama. Ambos tentaram, sem êxito, isolar o elemento de seus sais, resultado finalmente obtido por W.T. Brande e Sir Humphry Davy efetuando a eletrólise do óxido de lítio.
O nome do elemento provém do fato de ter sido descoberto em um mineral, embora fosse encontrado mais tarde como os outros metais alcalinos, nas cinzas das plantas.
Em 1923 a empresa alemã "Metallgesellschaft AG" começou a produzir lítio através da eletrólise do cloreto de lítio fundido, que é o processo ainda usado.
Fonte:
http://carmagazine.uol.com.br/materia/?id=10161141350